segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Blog Crítica da TV

Queridos amigos do Blog.


Após algum tempo de reflexão, decidi incorporar uma nova página, CRITICA SOCIAL DA TV.

Me parece que não é possível mais compreender o tempo atual sem um olhar atento aos movimentos da TV. O processo social da comunicação envolve interesses globais de mercado e poder. As ideologias do poder das corporações e dos estados convergem para a programação da TV. Será que teremos possibilidade de penetrar os meandros de um processo social de criação de imagens em um mundo marcado pela imagem instantânea que insere a venda de produtos de forma absoluta?

Não se trata, com isso, de um olhar moral sobre a TV, mas de uma crítica necessária às condições com que o capitalismo se desenvolveu tendo como braço de divulgação a TV. Por isso, é fundamental refletir sobre as condições em que são impostos os determinismos da programação e especialmente pensar que como um produto de valorização do mercado, a TV não sabe fazer outra coisa a não ser vender.

domingo, 22 de janeiro de 2012

A barbárie contra todos os Pinheirinhos


Atanásio Mykonios



Pinheirinho é aqui! Pinheirinho é todo o lugar onde a barbárie do capital investe contra os pobres. O mundo é aqui. Toda a história dessa sociedade se encontra na contradição essencial da produção de mercadorias. Todos os paradoxos convergem para o que está acontecendo em Pinheirinho. Sua gente não é diferente de todas as gentes do mundo. Quem pode proteger os pobres contra a barbárie das forças de segurança institucionais?
A justiça, o Estado, a instituição, qualquer coisa que represente as relações sociais se move com o intento de proteger o dinheiro e a valorização do valor. E isso expulsa os pobres da cidade, empurra-os para os lugares de risco, para as terras sem valor, até que sejam alvos de nova valorização.
O sonho da cidade que transborda em indiferença aproxima todos para a sobrevivência. Agora, nesse mesmo momento, alguns dormem, outros assistem à TV, alguns jogam baralho, muitos no silêncio que o domingo nos oferece. Mas a cidade parece abrigar a todos, mas de formas diferentes, a crueldade e a perversão com que os mais fracos são tratados na cidade é algo que não se revela, porque as ruas não mostram tudo.
Mas não é possível calar diante da atrocidade imposta pela lógica social do valor. Nada parece poder barrar essa lógica, porque os indivíduos não existem, são apenas conformidades momentâneas à realização absoluta do valor-dinheiro.
O deus supremo investe sobre os ímpios, indolentes  incrédulos. Aos que tiveram o azar de nascerem no infortúnio das relações sem-valor, são lançados no inferno sem chance. Cabe à polícia, aos governos, aos equipamentos de segurança, aos exércitos, às igrejas, às escolas, controlarem os pobres, reprimirem suas manifestações, seus desejos de liberdade.
Poderão consumir e manter-se nos liames desde que não invadam os espaços limpos que a estetização da mercadoria faz resplandecer. O entretenimento faz com que os sentidos fiquem submersos e entorpecidos, assim todos poderão viver no conforto das emoções sem saída, cuja determinação expressa a condição dos seres humanos sem qualquer distinção para a sua própria individualização e humanização.
Pinheirinho nos mostra a intolerância com que a sociedade produtora de mercadorias enfrenta os problemas de seus indivíduos. A justiça, no mundo do valor de troca está acima dos pobres. Mesmo com o empenho do Estado em introduzir ou incluir os pobres no bolo da acumulação do capital, não haverá tantos pedaços para todos.
E para toda essa repressão, a burocracia tem o papel do carrasco social a serviço da ordem e da lei. Que sejam todos desapropriados, que sejam todos lançados à rua, que todos paguem em conformidade com a lei. Destitua-se o humano! Quem estiver em desacordo, é efetivamente excluído.
Ao olhar para o alto e para o horizonte, tenho pouco a dizer. Minha ânsia por justiça se transforma em protesto de palavras. Que ao menos penetrem a consciência.
Pinheirinho não é nada sem as pessoas que nele vivem. É preciso resistir contra esse sistema!

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Para Elis

Atanásio Mykonios

Quanta saudade!
A arte é filha da liberdade. O artista deve assumir seu ser no mundo, lançando-o para que o mundo receba o que ele tem a oferecer. Talvez, por isso, é que tantos se sentem atraídos pela arte, talvez pela imensa possibilidade que ela nos dá – a liberdade pulsa pela arte e seu fundamento é criação.
Seu olhar, sua história, sua miséria, a arte revela-nos o que somos por nós mesmos. O mundo se refaz e sobre o mundo outros mundos são criados pela arte. Ela não é uma manifestação espiritual, é a instância suprema da existência humana, a ânsia da liberdade absoluta e o gesto angustiado da criação que bate à porta dos seres humanos para lhes manifestar que não veem nem sentem.
Alguns artistas absorvem o mundo em sua criação. Outros percebem com sofreguidão as agruras do mundo, anteveem o fim de um mundo e o começo de outro. Alguns se retiram do mundo e da sociedade quando intuem que não haverá mais lugar para eles. A obra de arte contém a história e a sensibilidade humana, não menos atenta aos problemas e à riqueza da cultura.
Mas poucos são os artistas que realmente mergulham na consciência da arte e da liberdade. Poucos são os que assumem visceralmente a arte a ponto de se entregarem a ela e aos seres humanos. Poucos foram os que, como Elis Regina, foram consumidos e consumados pela sua própria arte.
Ela nos deu um facho de luz, nos colocou em rota de colisão com a emoção que a arte nos oferece. Trágica, interpretou o mundo com seus olhos e os deu para que pudéssemos vê-lo por dentro de sua consciência. A inquietude foi sua marca, transpirada pelo olhar brilhante e certeiro.
Obrigado Elis.
Por aqui, a vida está muito chata! A música e a poesia estão mais pobres. A metáfora parece que deixou de existir. Descrevemos fatos e emoções, mas não sabemos criar pontes. Queimamos todas as nossas pontes, porque o mercado é quem manda na arte, até para além e aquém da indústria cultural.
Por aqui, o bêbado e a equilibrista estão nos subsolos das grandes cidades. Como os nossos pais, pouca coisa mudou e pouco pudemos viver. As prisões estão cada vez mais lotadas. Os pobres e seus gritos ecoam por toda parte. Pinheirinho é o símbolo de uma sociedade marcada pela indiferença da produção de mercadorias.
Seu sorriso me faz falta. Sua voz imensa e profunda, larga e oceânica me cobre o corpo e as lágrimas se misturam à saudade.
Vida e obra, morte e arte. Elis, uma estrela que ainda brilha na arte. Não importa o tempo, a ausência é sentida!

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Prazer e horror na sociedade produtora de mercadorias

Atanásio Mykonios

Parece que a degradação humana não tem limites. Os seres humanos são lançados à própria sorte e sobre eles há o peso da destruição e do abandono absoluto. A intoxicação dos indivíduos revela, de forma ainda mais cruel e trágica, a intoxicação social e todos os seus veios. O temor pela catástrofe se junta à ansiedade pela realização plena dos sujeitos, como se o mundo terminasse amanhã.
Vivemos um paradoxo estranho na atualidade. De um lado, a educação social para o prazer se estende para todas as formas de consumo, para todas as condições de comportamento, especialmente para o afetivo e as escolhas individuais. A sociedade educativa nos educa para o prazer, mas não tem controle sobre ele, ela sabe o que fazer até que o prazer siga os padrões para a sua aquisição, mas não se sabe como agir sobre o próprio prazer. Esta contradição é latente.
O prazer é um dos elementos mais significativos dessa sociedade – cotidianamente, o prazer nos interpela. Somos convidados a experimentar o prazer de várias formas. A publicidade deve estimular-nos a um prazer em expectativa, ou seja, a ser realizado quando da aquisição de mercadorias. Os estudos se aprofundam nessa área, há um esforço interdisciplinar para atender as necessidades do mercado.
A própria mercadoria, em si, carrega sua metafísica com o escopo de atrair para si a atenção necessária a fim de que seja consumida, mas não sem prazer nem realização pessoal.
Não podemos nos esquecer do prazer que a comida nos dá. As contradições se apresentam de forma crua. Ao mesmo tempo em que comer é um ato necessário à manutenção de nossa constituição, é uma ação de grande valor social e estético. A sociedade brasileira está comendo cada vez mais, estamos socialmente mais obesos, não mais felizes, de alguma forma, porque a obesidade conflita com a estetização da sociedade produtora de mercadorias.
E convivemos com o inferno das drogas que nos têm dado ainda mais prazer. Prazer que é escamoteado socialmente e tratado de forma moral. Cabe aos indivíduos decidirem a respeito de seus prazeres, alguns são lícitos, outros devem ser proibidos. A vida miserável dos sujeitos sociais é destinada ao cumprimento cego de uma determinação compulsória e abstrata – trabalhar e consumir.
Somos adictos socialmente, nossa perversão não nos contentamos em controlar os indivíduos, é preciso colonizar seus corpos e suas consciências. O sonho de atingir um estado livre de consciência, desde Platão se tornara um objetivo formal especialmente do Ocidente. A liberdade do corpo implicaria liberdade absoluta da consciência. Estar livre é viver no reino do prazer sem limites e nesse sentido, a consciência é o lugar para que isso fosse efetivado.
Mas eis que o prazer tem nos dado outra face de horror. A iminência do prazer tem causado grandes transtornos psíquicos em pessoas que se sentem ameaçadas pela perspectiva do descontrole face ao prazer. Ele nos é oferecido e, mesmo que seja uma estratégia de mercado estimular as sensações e o prazer ao extremo, é fato que o prazer é algo que nos iguala.
Temos de considerar, ainda, a questão da demonização do prazer. Ele nos é oferecido e espera-se que os indivíduos, à moda de Kant, tenham autonomia para não aceitarem seu oferecimento que, a rigor, o identificamos com uma espécie de demônio que sabe de nossas fraquezas e nos engana, se aproveitando de nossa condição de incautos. Nossas necessidades se confundem com o prazer de que necessitamos para satisfazer outras tantas necessidades.
O prazer permanece no horizonte social. Mas a culpa também nos persegue. Somos todos perseguidos pelo fantasma que nos assombra. O fantasma do prazer com várias faces, um monstro que nos instiga ao descontrole.
Por exemplo, a mesma sensação que o açúcar nos dá é perseguida pelos diabéticos com os alimentos dietéticos. O que importa é sentir a mesma coisa e o mercado produz de tal forma que o prazer é reproduzido indefinidamente. O açúcar faz mal ao diabético, mas o prazer não.
Assim é com o crack. A dependência química é um fator que nos mostra a devastação herdada com o uso do crack. Mas é um dos elementos da questão. O acesso mercadológico da droga fez com que as camadas menos favorecidas tivessem condições de consumir o crack.
E com isso, assim como o fato histórico de que na sociedade atual são os indivíduos responsabilizados pelo próprio consumo e por suas necessidades, os usuários de crack são deixados à própria sorte. O tratamento, proporcionalmente, é infinitamente inferior às necessidades quantitativas de resgate dos indivíduos adictos.
Estranhamente, os indivíduos são acompanhados até adquirirem o prazer, mas ao consumirem-no, são abandonados de modo absoluto. Se cada um se tornar um esquizofrênico, um idiotizado ou um culto, não importa mais ao mercado. Caberá aos psiquiatras, aos sacerdotes, aos médicos e aos policias tratarem dessa devastação social.
Ao desbaratar a comunidade de usuários da Crackolândia, a cidade de São Paulo se viu diante de uma realidade que para ela era parecia invisível. Os usuários também têm outras necessidades, eles comem, bebem, dormem e espalhados se tornaram um problema.
Isso revela um aspecto interessante na sociedade produtora de mercadorias. Quanto mais o valor baixa, em função dos processos produtivos, mais o prazer se espalha, diga-se, o prazer proposto pela sociedade produtora de mercadorias. Nesse sentido, não podemos deixar de considerar que a produção de crack é, em última instância, produção de mercadoria, barata ou não, é mercadoria e que revela a face absurda do processo produtivo.
Não faz diferença se estamos submetidos a um bombardeio de prazeres instantâneos ou se seremos obrigados mergulhar em uma espécie de refletirmos tantricamente sobre nossa existência. O prazer será nosso companheiro daqui para frente.
Viver na perspectiva do fim do prazer é tão temerário quanto a sua escassez.
Teremos de viver com uma avalancha de mercadorias e um universo de prazeres. Ao que tudo indica, todo o prazer do mundo será um modo de instituição de uma civilização do prazer, até que a exaustão do capitalismo nos coloque na decisiva fase em que teremos de refletir sobre as necessidades impostas pelo prazer.

domingo, 1 de janeiro de 2012

O não-senso de nós mesmos

Atanásio Mykonios

Mas o que as pessoas querem ou o de que de fato precisam? De que precisam pode não ser a realidade de sua própria consciência. É possível que as reais necessidades sejam, na atualidade, apenas de ordem subjetiva. Ou, em outras palavras, conforme o que podemos objetivamente dizer, as necessidades estejam na esfera da decisão puramente pessoal. A auto-ajuda, o pensamento religioso, as demandas por um manual de instruções sobre o que fazer e como fazer. O discurso das grandes formas está impregnando o pensamento e o pensado. Não parece mais haver distinção entre ambos e especialmente estamos presos ao espetáculo absoluto. A absolutização do modo banalizante das relações é uma norma não mais relativa, parece uma lei que não permite nenhuma tergiversação.
Mais uma vez alguns são atirados ao abismo da cegueira social sem que haja condições de atingir a totalidade. A loucura silenciosa é uma companheira fiel de alguns, contra a imensa maioria anestesiada pelo torpor de uma vida insana e sem reflexão alguma. A raiva e o sentimento de impotência são constantes, certo voluntarismo sempre volta às possibilidades da consciência, mas tudo isso não passa de uma grande ilusão. A liberdade que segue no horizonte como u-topos nada mais é que uma miragem. As cartas estão postas à mesa tragicamente, alcançamos os objetivos tão caros à modernidade iluminista, avançamos sobre a natureza com a voraz petição do progresso da modernização capitalista, fincamos as bases da idolatria ao trabalho como forma de libertação das massas consumidoras, ativamos as condições de destruição dos indivíduos pela competição.
Mesmo assim, não estamos bem. A tristeza está por toda parte, a angústia que não tem nome, não tem face, não tem dono, permanece como inquilino absurdamente preso à nossa consciência vadia. São raros os momentos em que a experiência humana ganha o sentimento oceânico, nada parece mais importar a não ser o estar presente no presente sem qualquer história. O sujeito real da história não são as culturas ou os indivíduos, mas apenas uma constituição absoluta que abstrai às pessoas sua real possibilidade como indivíduos. Sentimentos humanos se confundem com os sentimentos construídos pela necessidade do ser social que ora não passa de uma fantasmagoria metafísica.
A política não mais existe. Mesmo antes das grandes guerras, havia o prenúncio de que o ato fundamental do Estado estava a serviço da relação econômica substancial – a produção de mercadorias. E quando chegou de forma definitiva a revolução científico-tecnológica com o fito de promover a mudança que faltava para o processo de produção, a política nada mais representava a não ser um jogo teatral que pudemos distinguir se se tratava de uma comédia, uma tragédia ou um drama de mau gosto. Mesmo com a derrocada do Estado democrático, do Estado socialista, do Estado fascista, o que importa é a noção de que o Estado serve peremptoriamente ao mundo ordenado juridicamente pelas abstrações do trabalho e do dinheiro absoluto. A tristeza é a marca de um mundo despolitizado até a raiz.
E a preguiça social graça como regra orgulhosa dos sujeitos sociais. Pessoas têm dificuldades em concentrarem seu próprio cérebro em favor de alguma atividade intelectual. Ler tornou-se um esforço descomunal e é preciso que toda leitura seja marcada com imagens que facilitem tal esforço. A ideia de alguma coisa não pode se fixar por muito tempo, como uma mercadoria que não deve sofrer o aprofundamento de suas mazelas, a leitura requer dos indivíduos uma atitude de desconfiança.
O que querem as pessoas ler? Ora, não sei, não posso mais distinguir. A crítica social parece perder seu sentido num mundo absolutamente recheado de insignificâncias e absurdidades sem qualquer racionalidade a não ser a racionalidade intrínseca que penetra o consciente inconsciente de todos. Por isso, a revolução pela liberdade virá, quiçá no âmago da exaustão humana, quando não mais houver saída para a alienação, o espetáculo, o grotesco da existência, quando não mais houver sentido no não-sentido, quando todas as formas da mediocridade não traduzirem o medíocre dos seres humanos ou, quando, de alguma forma, formos reféns da barbárie. Talvez quando estivermos banalizados pelas relações pessoais, reduzidos a meras formas disformes de um mundo de reprodução do nada para o nada, poderemos então perceber o vazio que nos toma por dentro vindo do mundo que fomos capazes de idolatrar.
Mas temo que apenas quando a família, o Estado, a propriedade, a religião, a educação e a política desabarem por completo, quando os discursos sociais e o comportamento encapsulado dos indivíduos forem de tamanha contradição que não mais poderão se sustentar. Quando as promessas não mais se cumprirão aí poderemos voltar a atenção a nós mesmos para além do que há a nos escravizar e do qual não temos qualquer controle.