Por Atanásio Mykonios
Seria mais honesto que neste dia,
ao invés de somente elogiar as mulheres, reconhecer que há uma série de
injustiças, mazelas, opressão, violência, contra todas as mulheres. Contra aquelas
que lutam, contra aquelas que não se comprometem.
Seria mais justo se cada um reconhecesse
que ainda somos uma sociedade cujo poder é masculino, os sistemas políticos, a
estrutura econômica, nossas religiões, enfim, o mundo é masculino, masculinizado
e estruturado para o poder do masculino.
Até agora, não foi possível derrubar
e destruir este poder que é estrutural e sistêmico. É preciso, portanto,
apreender as forças sociais e políticas de dominação que estão na raiz de todo
modo de exploração contra a mulher, desde o seu nascimento até a sua
atualidade.
O capitalismo aprofunda essa
desigualdade de poder, aumenta a exploração sobre as mulheres, segrega-as
conforme a organização social, conforme a cultura que nos dá em parte a nossa própria
face de domínio.
A herança escravagista está entre
nós e em nós. Submetemos as mulheres à lógica da dominação do corpo, por meio
da ideologia da Casa Grande sobre a Senzala. Ainda vivemos em um ambiente em
que possuir a mulher é como possuir gado, ovelhas, cabras, cavalos, bois e mais atualmente, como possuir um carro ou um negócio. Estuprá-la para muitos é apenas um detalhe na filigrana da dominação.
Os homens, especialmente neste
país, se valem de seu poder político e econômico para imporem, sob o manto de
discursos religiosos e morais, o escárnio sobre a existência feminina,
impondo-lhe toda sorte de controle social e controle econômico, colocando-a sob um tapete quando lhe interessa e utilizando de um discurso anacrônico para garantir mais direitos e submissão.
Há uma regressão observada a olhos
nus. A crise do capitalismo que nos leva a uma crise das formas de poder
político, cria uma espécie de campo de batalha em que este homem, com seu poder
masculino sobre o mundo, atua de forma a esmagar qualquer avanço legítimo de
confronto para os direitos e para a igualdade.
A moralização da sociedade
brasileira, por meio do que há de mais nojento e abjeto, tendo como arautos os
que mais praticam a violência com seus discursos de ódio e manipulação,
encontra um campo fértil até mesmo entre contingentes aparentemente
esclarecidos, mas que promovem a perseguição e o ódio contra até mesmo as
mulheres que lhes deram a vida.
No trabalho ou em qualquer outro
lugar, os olhares masculinos servem para manter a presa sob o controle, como se
as mulheres só pudessem circular e viver em uma espécie de grande campo de
concentração social.
A democracia sexual só será
possível no momento histórico em que essas estruturas de dominação e o sistema
capitalista forem destruídos por completo e que formos capazes de construir, a
partir dos nossos próprios escombros, uma nova forma social em que a mulher não
esteja sob o tacão econômico, religioso, cultural, político, ou de qualquer
outra natureza, que grassa hoje e que é, sob todos os aspectos, a vergonha de
nossa civilização.