Por Atanásio Mykonios
Penso que uma parte de nós, especialmente nas
academias (não as de ginastica), olham para a sociedade brasileira de forma
muito confusa. Muita gente tem visão de classe média, de gabinete, que critica
e ironiza um tal “caráter” do “povo brasileiro”. Alguns ainda creem na indolência,
na preguiça e no “comodismo” das pessoas que não se mobilizam e não reagem. Confesso
que às vezes eu também caí nessa arapuca pseudo-ideológica, que que ideologia não
tem nada, é uma análise rasa e de araque!
Os trabalhadores brasileiros sempre estiveram
mobilizados, em determinados momentos, tiveram também a sabedoria de recuar,
dadas as condições de repressão. Não nos esqueçamos de que a repressão sempre
foi muito forte, sempre foi violenta, sempre foi de cunho sanguinário contra os
trabalhadores, os negros, as mulheres, os desempregados. Os trabalhadores
sempre lutaram, eu fiz um levantamento, de 1945 a 2018, foram registradas
(exceto os 10 anos de chumbo da ditadura – 1969-1979) 33.956 greves, não houve
um único mês em que os trabalhadores não se movimentassem, de um modo ou de
outro.
Além disso, o Brasil viveu, ao longo de sua história,
aproximadamente 101 revoltas, conjurações, rebeliões, guerras regionais, lutas
de toda sorte, movimentos, golpes. O Brasil nunca foi esse mar de rosas, nunca
foi esse lugar do “comodismo”. Ao contrário, lutas de resistência, de reação,
de enfrentamento, conflitos etc.
Movimentos sociais, organizações sociais não governamentais,
centenas de grupos nas periferias, grupos culturais, as ruas ocupadas quase
todas as semanas. O povo brasileiro (essa coisa abstrata que não diz muita
coisa) não aquilo que emana de nossos gabinetes refrigerados. As cidades são um
amplo lugar de lutas, de enfrentamentos por espaços, a expressão de ocupações,
de o avanço dos pobres que resistem em resistir por todos os lados. Ocupam os
terrenos, os buracos, as vielas, os becos, organizam suas relações econômicas,
as pessoas continuam, insistem, não estudam tanto, não têm a formação que
sonhamos, mas os trabalhadores lutam.
O problema são as nossas lideranças – e nós mesmos, de
modo geral. De tempos em tempos, a luta fica mais acirrada. De tempos em
tempos, vem a repressão e junto com ela toda sorte de ameaças, o medo é muito
grande. O Brasil foi governado, em boa parte, por governos de golpes e
elitizados ao extremo.
Os trabalhadores, todos eles, nós também,
continuaremos, somos a história dessa terra, milhões continuam atentos. Talvez não
seja do tamanho que gostaríamos. Penso que também as elites econômicas,
políticas e sociais, têm muito medo dos trabalhadores, que estão entupindo as
periferias, as favelas, os mangues etc. O Brasil é grande, muito grande para o
definirmos em um parágrafo.
Nós temos um modo diferente de estar nesse lugar, de
lutar nesse lugar. É verdade que estamos sendo atirados aos esgotos econômicos e
sociais. De alguma forma, teremos de enfrentar tudo isso e os trabalhadores têm
enfrentado com a dignidade que lhes é histórica.