Por Atanásio Mykonios
Hoje,
no Brasil, temos um fenômeno político, social, cultural e econômica, que nos
coloca numa nova luta tanto social quanto de classe - é o Estado contra a
sociedade
Não
me parece que os grupos que chegaram ao poder querem implantar um regime
fascista ipsis litteris, pois seria levar a cabo um processo, não exatamente
determinista, mas de caráter evolucionista em que a sociedade culminaria no
Estado-nação por excelência. O Estado-nação em sua identidade formal e
essencial composta por um regime eminentemente fascista, leva a um nacionalismo
acima das lutas de classe, sem abrir mão do conteúdo formal necessário do
capital. Não parece ser o caso atual.
O
Estado-nacional brasileiro foi tomado por bandos que se organizaram em torno de
determinados interesses e guindados, todos, por uma espécie de porder-guarda-chuva
que é o sistema bancário e financeiro. A hegemonia econômica, na atualidade, é
exercida pela ordem do financismo capitalista.
O
que há de fascismo é, em grande medida, ações que têm um verniz fascista,
contudo, têm como elementos atuantes uma convergência de perspectivas e
retrospectivas políticas, sociais, econômicas etc. Os escravagistas se misturam
aos neoliberais e àqueles que desejam garantir privilégios de toda ordem. Enquanto
isso, esferas do Estado-nacional são colocadas à prova à medida que o Estado
age contra a sociedade.
O
plano inicial é a tomada do Estado-nacional para o desenvolvimento e a aplicação
de ações contra a sociedade, de maneira geral, partindo dos princípios econômicos,
que regem tal plano e baixando para o plano das relações e comportamentos
individuais. Há uma mescla de luta de classe e luta apocalíptica contra os demônios
da própria sociedade. Tem-se um duplo caráter nesse processo, de um lado, a
noção provisória do poder, para a aplicação de ações econômicas que levem a um
aumento do poder do sistema financeiro e, de outro, a necessidade de manter o
poder para impor ações de caráter repressivo contra sociedade
Há
um Estado, propriamente, que se encontra num estágio de deterioração muito
intenso. Mesmo assim, as forças políticas e os grupos de poder econômico tomaram
o Estado a partir de 2016. Tentaram cumprir um ideário e uma agenda que, ao que
tudo parece, não lograram êxito até o momento no que tange à plena imposição do
calendário da burguesia, mesmo assim, no que concerne às condições gerais de produção
e especificamente no que tange às esferas de exploração e expropriação, o
capitalismo brasileiro caminha confortavelmente nesse espectro.
Além
do mais, o que parece ser a perspectiva de permanência do grupo que
ideologicamente sustenta o atual presidente, é atuar sobre o Estado e sobre as
esferas e instâncias sociais, com o propósito de imprimir a marca ideológica teocrática
e para isso a permanência no Estado, que pretende esse grupo, deve ser longeva.
No entanto, o Estado não se caracteriza apenas pela capacidade de instituir,
pela força, a hegemonia ou a coerção social, necessárias para a implantação de
constitutivos morais e pseudoteológicos, hegemonias que se entrelaçam à educação,
aos comportamentos sociais, públicos e/ou privados, sem que as reações sejam
fortemente um sinal de oposição.
O
bloco de poder econômico se manifesta continuamente pelos aparatos de disseminação
das informações e dos mecanismos de divulgação das ideias, consolidados pelos
termos de “narrativas”. Paulo Guedes, o superministro da economia não tem plano
algum abrangente de recuperação econômica a não ser implantar uma economia para
o sistema financeiro. Parte da burguesia nacional está profundamente vinculada,
por meio de suas estrondosas dívidas, ao sistema bancário-financeiro, por esta razão
não se manifesta abertamente contra o governo, apenas em lugares muito
restritos e envergonhadamente.
A
imposição de uma política econômica, no processo histórico da economia
política, encontra no atual momento, ao que parece, segundo as condições em que
o sistema do capital mundial e local se apresenta, as possibilidades de um governo
autoritário que imponha a exploração absoluta da produção de valor e mais valor
que só podem de fato ocorrer se a economia nacional for levada a um extremo de rebaixamento
quase total da força de trabalho, gerando, assim, uma massa de trabalhadores
que devem ser condicionados pela força das armas a produzirem bugigangas para o
mercado das mercadorias.
Será
preciso impor um regime de força para implantar uma economia de desastre e
também um regime social semi-escravagista de modo a garantir que o Brasil fique
relativamente confortável no cenário do capital globalizado.
Até
o momento, é o Estado contra a sociedade!
Lembremos
Antonio Gramsci ao dizer que:
“O fato de que a velha
geração não consiga guiar a geração mais jovem é em parte também a expressão da
crise da instituição familiar e da nova situação do elemento feminino na
sociedade. A educação dos filhos se confia cada vez mais ao Estado ou a
iniciativas escolares privadas e isso implica um empobrecimento “sentimental”
em relação ao passado e uma mecanização da vida. O mais grave é que a velha
geração renuncia à sua missão educativa em determinadas situações, baseando-se
em teorias mal compreendidas ou aplicadas em situações diferentes daquelas de
que eram expressão. Caem, inclusive, em formas estatólatras: na realidade, todo
elemento social homogêneo é “Estado”, representa o Estado, à medida que adere
ao seu programa: de outro modo se confunde o Estado com a burocracia Estatal.
Cada cidadão é “funcionário” se é ativo na vida social na direção traçada pelo
Estado-governo, e é tanto mais “funcionário” quanto mais adere ao programa
estatal e o elabora inteligentemente” (GRAMSCI, 1999b, p. 61, Q3, §61).
GRAMSCI, A. Cuadernos
de la cárcel. México, D. F.: Ediciones Era / Benemérita Universidad
Autónoma de Puebla, v. 2, 1999b.