Por Atanásio Mykonios
Uma vez que a Internet impõe um estado mental, envolto na consciência mundial viral, a tecnologia é apresentada como um dado da realidade natural do próprio desenvolvimento do capital se torna um elemento de qualificação da consciência alterada pelo modo virtual de compreender o mundo. Ademais, seguindo os moldes dessa contradição, a tecnologia é apresentada como absolutamente neutra colocada à disposição do desenvolvimento humano, sem considerar, até mesmo do ponto de vista ideológico, sua estreita ligação com o desenvolvimento da rentabilidade do capital em geral; e o fato de que a terceira revolução industrial plantou as condições, tanto lógicas quanto históricas, do fim da produção de valor em escala suficiente. O fim do trabalho vivo é a expressão máxima dessa condição inexorável, tecnologia dos computadores, em rede, implica a alta especialização das forças de produção e a inevitável queda dos rendimentos reais do sistema, também em escala mundial.
A cultura do capital, compreendida pelo modo industrial
de ser reproduzida, atinge o ápice de seu desenvolvimento, material e
imaterial, conjugado num processo dialético intenso, repleto de contradições.
Alia-se a este processo, o modo pós-moderno de abranger e condicionar as ações
dos agentes virtuais que se mantêm presos a um espectro tenebroso no contexto
dos conflitos reais que absorvem as sociedades. A internet apresenta o efêmero
dos discursos baseados em ideologias oriundas de grandes troncos de dominação e
das formas de interpretação, elimina estruturalmente a contradição entre
conteúdo e forma e promove o provisório da crítica, seja à direita ou à
esquerda.
O controle administrativo das relações de produção, das
forças de produção e do modo de produção parece nos levar a um patamar de maior
eficiência, mas a complexidade dos sistemas de computadores exige mais
especialização e modernização, levando os agentes a uma exaustão – a
concorrência universal força todos a se manterem no jogo. A Internet se resume
à própria riqueza abstrata do sistema do capital. O desenvolvimento do capital
em sua fase derradeira se situa no âmbito de sua total incapacidade de realizar
a mais-valia e o aumento da riqueza financeira mostra a sua condição abstrata
no contexto de um processo social de plena ilusão de sua liberdade.
Uma espécie de comunismo de cidadania, que implicaria,
virtualmente, tanto uma suposta liberdade de expressões quanto um acesso
aparentemente igualitário às informações, transformadas em mercadorias, nos
leva a uma cidadania sem qualquer expressão real, vazia e ainda mais
condicionada à abstração do termo, inferido pelo Iluminismo, como tentativa de
envernizar o projeto civilizador do capital, numa ilusão programada de que a
Internet é um paraíso sem valor e sem trocas, o gratuito parece fazer parte da
mente dos usuários virtuais. Mas o aburguesamento das massas, mesmo que vivam
em face à linha da miserabilidade ou se digladiem para garantir migalhas na
combalida sociedade produtora de mercadorias, fez com que se tenha a impressão
confessa de que estamos num mundo sem dinheiro, sem relações de exploração,
onde todos estão livres para exercer a sua expressão de ideias virtualizadas,
uma espécie de democracia esvaziada e espiritualizada.
A Internet traz o vaticínio da autodestruição do capital,
sua metacultura nada mais indica que o esvaziamento de um sistema que agoniza
sem parar. Enquanto isso, esconde-se a realidade social que impinge a todos o
estado de exceção continuado, em que todos estão envoltos no manto da cegueira
jurídica e midiática. O controle social instituído pelas redes de computadores
é mais eficiente que os gestores de carne e osso, que ficam nos portões das
empresas. Não tardará para que a barbárie institucionalizada pelos
Estados-nação e pelos seus aparatos jurídicos avancem também sobre a Internet,
as ilhas de suposta liberdade não existirão a não ser na mente e nos corações
desavisados. A cultura da fábrica social desmorona sem que os olhos possam ver
com clareza.
A passividade social migrou para o interior do virtual, a
tecnologia transformou a vida cotidiana e concreta em pura virtualidade, como
exemplo, o dinheiro que circula como capital virtual. As relações sociais de há
muito, antes mesmo das redes virtuais, foram transformadas em virtualidades
mediadas pelas máquinas. O pensamento virtual é a condição pós-moderna, isto é,
difusa, confusa, histriônica, passiva ao mesmo tempo, politicamente desengajada
e sem materialidade. É o estado de letargia que insiste em ser real,
condicionando os indivíduos a uma espécie de estímulo-resposta sem o ato
político real.
Os sistemas em rede criam um estado permanente de
transitoriedade e paralisia, ao mesmo tempo. Transitória é a condição da
modernização capitalista. A paralisia social expressa as formas de inação que
atinge os sujeitos sociais em suas relações políticas, a impotência está ligada
à organização de uma sociedade transversal que apresenta uma realidade
paralela, sem limites e, ao mesmo tempo, absolutamente efêmera. As formas de
controle administrativo se atêm ao que há de mais atual, no entanto, também as
empresas e especialmente o estatismo se veem premidas pela necessidade de
constante atualização. Os Estados-nacionais e seus serviços estão capturados
pela rede que é estruturada em dispositivos que controlam burocraticamente a
produção e engessam as rotinas produtivas.
A tecnologia é a nova Ideologia que reifica as formas de
produção da estrutura vigente, o novo dogma da sociedade que engloba todas as
esferas da produção e suas condições de reprodução. Sincronização,
sistematização em massa de imagens e arquivos, administração dos tempos de
aquisição e consumo, 24 horas no ar sem interrupção. São alguns aspectos do
estado alterado da consciência que é massivamente domesticada, o tempo da
produção é o tempo integral dos seres humanos em total obediência ao movimento
tecnológico. O mundo das imagens é a realização mais profunda de um anseio da
consciência impregnada pela ordem do capital, numa tentativa desesperada de se
livrar do peso material da existência, um conteúdo platônico insiste em
perseguir a humanidade, ainda mais na atual etapa do sistema social mundial do
capital.
A individualização burguesa é o substrato da condição
virtual. Os usuários globais das redes são átomos que navegam e compõem um
mosaico que exprime a forma totalitária do isolamento social que favorece o
tráfico de mercadorias virtuais. Proletarização social pelas condições
materiais de empobrecimento em escala global com verniz ideológico do
aburguesamento, não se trata de um pobre de direita, mas sim da consciência
burguesa que penetrou decisivamente em todas as camadas de trabalhadores e em
especial daqueles que não têm mais qualquer possibilidade de serem rentáveis
aos olhos do sistema. O ato abstrato dos indivíduos sociais significa a
expressão de um refinamento no pensamento abstrato.
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