Atanásio
Mykonios
Há
tempos tenho estado recalcitrante em escrever. Acompanho o que ocorre com o
capitalismo no mundo. Não se pode entendê-lo com um simples olhar local. Estamos
metido em uma confusão das maiores, em que se perde a noção das perspectivas, a
noção do espaço público, a privatização da existência ocorre em todos os
âmbitos da formação humana e, apesar disto, o Estado parece estar mais atuante
do nunca diante da crise mundial.
As
forças locais estão, no momento, subsumidas a uma lógica perversa – a lógica
desumana da sociedade que produz a mercadoria e a reproduz em sua forma fetichizada.
Em todos os lugares, a estrutura social e jurídica se adaptou ao ordenamento
necessário para sustentar as relações sociais do mercado.
Mas,
aqui podemos ver a vasta teia que marca a vida dos seres humanos. No mais das
vezes, não nos damos conta da grandiosidade desse processo e o modo pelo qual
colonizou a vida, até mesmo nos mais ínfimos detalhes do cotidiano. E quando
algo não vai bem, há uma tempestade que assola a normalidade.
A
agonia de uma crise se arrasta.
Pelo
mundo, os seres humanos se levantam contra o capitalismo. Até nos EUA um
movimento cresce absurdamente. Ao que parece, mais e mais, as críticas se
tornam substanciais e consistentes, têm atingido o cerne do processo
capitalista.
Por
outro lado, muito perceberam que não haverá futuro seguro se o sistema insistir
em manter a si mesmo, em detrimento do próprio mundo que o abriga. Não sem
problemas, uma vez que as críticas são desferidas, em parte, contra o sistema
financeiro, acusando também os grandes manipuladores dos capitais
transnacionais.
Mas,
ainda diante da crise que se torna cada vez mais aguda, é preciso lançar um
olhar mais atento à Grécia. O país dos meus pais, o país dos meus ancestrais
está agonizando há mais de 3 anos. Os gregos mergulham numa espécie de
dissolução social absoluta. A sociedade grega está em vias de se dissolver. A
base material que sustenta a base social está praticamente em vias de colapso
anunciado - a ruína social não é mais uma ameaça, agora é realidade.
No
passado, os gregos inventaram um modo de viver socialmente em que um exército
de escravos fazia tudo e garantia o fundamental para os cidadãos gregos. Esses
escravos, que chagaram a ser contados aos mais de 400 mil na Atenas de
Aristóteles davam aos gregos de nascença uma pré-condição para exercitarem sua
política. A garantia do processo social produtivo favorecia as ações políticas
liberadas da privação material.
Pois
então, mesmo com esse exército de fazedores e reprodutores da vida, os gregos
se deparavam com problemas técnicos do modo pelo qual as condições políticas
ocorriam. As formas de poder e organização do Estado, o cratos grego nunca foi um modelo ideal, isento dos conflitos de poder.
A
política inventada pelos gregos tinha uma condição sine qua non – a vida material e sua reprodução estavam asseguras.
Pois,
ao contrário de seus ancestrais, os gregos atuais estão vendo sua sociedade
afundar num caos sem precedentes, um atoleiro político histórico em que todas
as instituições entram numa zona de risco iminente e isto mostra uma realidade
que fora gestada pela crítica radical ao capitalismo.
A tautologia social implicada pelo capitalismo revela sua própria fragilidade. No
âmbito da vida normal e natural, o capitalismo faz a vida ser uma coisa comum
interiorizada na linguagem humana. Tudo parece fundamental e não-argumentativo,
como um mito que nos protege e nos guia à vida plena.
Basta
trabalhar, ganhar o dinheiro, comprar coisas, adquirir a cultura, estudar,
viajar e ler alguns livros. Em outros lugares, a luta pelos direitos continua,
os pobres e os movimentos sociais se organizam para conquistarem mais direitos,
para isto, é importante que alguns inimigos estejam up to date.
Onde
estão os erros? Na malversação do erário? Na corrupção como nossos valorosos
brasileiros atualmente o entendem? Será um problema de administração estatal?
Seriam os partidos os grandes responsáveis pela derrocada dos países
endividados? Seriam os deuses investidores? Os Estados nacionais se desmancham
ante a possibilidade de os investidores retirarem seus tesouros das terras prometidas.
Todas
as terras são santas para o capital. Ele é volátil porque no processo de
investimento, não deve encontrar fronteira. Mas sua própria fronteira é seu
desastre, o limite da produção de valor. À medida que o mundo reinventa sua
revolução científico-tecnológica, produzir valor sobre a mercadoria, torna-se
um exercício utópico, uma vez que esse topos
(esse lugar), onde o capitalismo se faz está desvanecendo. Por isto, todos
estão empenhados em encontrar formas de manter a forma social de produção de
mercadorias.
Isto
não será mais possível. Haveremos de encontrar uma forma. A barbárie não está
distante das nossas narinas, ronda a vida social. A débâcle institucional está em vias de se tornar um fato real.
Drasticamente,
o capitalismo não tem mais como arrancar dos indivíduos sua capacidade de
sustentar a abstração criada por ele mesmo. Produzir valor para garantir o
trabalho futuro por meio de financiamento abstrato, isto é um sonho mergulhado
num sono profundo. Radicalmente, para suportar sua metafísica, o capitalismo,
ele mesmo corta salários, mantém as horas de trabalho e o tempo se torna,
novamente, a mola mestra que irá recuperar o processo de produção de valor
sobre valor.
Em
um país milenar, o que esperar quando o tecido social se esgarça rapidamente?
As bases sociais não são suficientes para garantir a vida para além da crise. A
sociedade não encontra espaços para respirar - sindicatos, partidos,
movimentos, as massas, os desempregados, tudo começa a ruir como um quadro que
se desvanece aos próprios olhos.
Um
povo instruído, com alto índice de escolaridade superior. Baixa demografia e
pequenas extensões possibilitariam melhor condições de comunicação e
articulação. Mas, um povo intelectual e culturalmente preparado não parece ser
capaz de dar conta da crise capitalista e superá-la. Pergunta-se então, de que
preparo é possível falar?
O
mito de que um povo bem educado pode responder a qualquer catástrofe cai por
terra porque não se sabe o que deve ser colocado no lugar. A perplexidade, o
desespero, a iminência da pobreza real, o esmagamento do futuro das gerações
atuais, carrega de tintas escuras o já obscuro cenário da Grécia.
Seria
o momento de perceber a oportunidade para a superação desse processo. Seria um
período histórico para prepararmos nossos jovens, os alunos, os sindicalistas,
os ativistas, enfim, o mundo mobilizado, para uma nova etapa da humanidade.
De
certa forma isto está acontecendo. Jovens gregos têm tomado as ruas e praças e
organizado novas formas de relação social. Eles dizem que cabe ao povo decidir
acerca de seu destino. Um genocídio está prestes a acontecer, mas a juventude
está a dizer ao mundo que outro mundo é possível. Ouçamos o que ela tem a
dizer!