sábado, 20 de julho de 2019

A guerra e o fim

Por Atanásio Mykonios


Toda guerra é insana. Exércitos são formados, treinados para matar e destruir. Os homens e as mulheres são recrutados para cumprirem seu destino de morte com a certeza de que farão o melhor. Imbuídos de suas certezas coletivas, avançam decididamente sobre o inimigo, é sua missão destruí-lo a qualquer custo. A maioria desses soldados não sabem a razão das guerras, mas as lutam com firmeza. São tragados pelo terror e a infâmia, desaparecem nos campos, nos vales, nos esgotos, somam-se aos desvalidos e em seguida são esquecidos. Carregam suas bandeiras como libertadores de um mundo enclausurado, rompem os grilhões e atacam por todos os lados. 

Não importa se as guerras travadas hoje têm novas formas, mais brandas ou menos dolorosas. Talvez as guerras não destrocem tantos corpos nem aniquilem as crianças e os velhos, abandonados nas trincheiras do terror. Continuam a serem guerras que esmagam as liberdades, sufocam cada lampejo de dignidade, tudo sucumbe, mas tudo também tem um fim, como as guerras, os impérios, a dominação, como a opressão que esmaga a juventude. Haverá um dia em que esses que nos combatem morrerão ser saber por que fomos eleitos seus inimigos. Haverá o dia em que muitos cairão em si mesmos e compreenderão a que foram submetidos. 

Nenhuma guerra é justa, mesmo que o ódio pareça sê-lo, cada corpo destroçado pela fome, na doença, na loucura, pela ignorância, será erguido no portal da história, todos saberão que as guerras não têm dono, apenas demência, sofreguidão, tortura e crueldade. Saberão que seus governantes não tiveram a sensatez para barrar o terror, entenderão que o direito e a justiça pelo pão e pela paz são conquistas dos homens e das mulheres. Os donos da guerra nunca sucumbiram às suas próprias atrocidades, planejam a morte com a racionalidade científica, ordenam a vitória, remontam ao passado glorioso, sem terem a noção de que sua selvageria cobrará o preço da iniquidade sobre todos.

Hoje, estamos presos a uma guerra sem fronteiras, que se move através dos aparelhos, é a guerra dos que odeiam o mundo, a alegria e a arte. É a guerra dos que chegam ao poder, contra a paz. Este homem e aquele outro que nos governam, e tantos que emergem de todos os porões, têm o cálculo do presente, estão mergulhados em sua cegueira histórica e contemplam orgulhosos sua própria ignorância. Dão suas ordens e comandos aos exércitos virtuais e seus comandados obedecem caninamente como soldados prestes a matarem. Não sobreviverão, sabemos disso, serão tomados pela força de seu ódio, como soldados rasos, morrerão assim como muitos de nós. 

Não há guerras que não deixem marcas profundas. As guerras destroem o que há de mais sublime em cada um de nós. Sairemos dessa guerra derrotados, teremos de reconstruir a nós mesmos e a nossa terra. Estamos por um fio, por todos os lados desmoronamos, sabemos, no entanto, que o caminho escolhido por este homem não terminará em flores. As flores serão esmagadas, pisadas, em algum lugar renascerão assim como cada um de nós terá de cumprir a dolorosa tarefa de renascer.

As certezas que ora nos movem, muito em breve serão nada mais que a nossa vergonha. Os ódios compartilhados que hoje são nutridos com orgulho, desvanecerão com o vento que espalhará as nossas cinzas. Ficaremos aos montes entulhados nas estradas a nos perguntar o que fizemos de nós mesmos. Nada pode permanecer até o fim como começou. Talvez não saberemos disso em momento algum, talvez tenhamos de pagar pela nossa estupidez e brutalidade e de fato pagaremos. Aqueles que agora compreendem a dimensão dessa tragédia, são os guias que apontam os caminhos para uma multidão de cegos. 

Tenhamos a serenidade e a paciência necessárias. Nenhuma guerra é justa.



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