Por Atanásio Mykonios
O sistema mundial de computadores não é apenas um sistema de comunicação entre computadores em rede, mais que isto, é um sistema mundial de inteligência artificial muito eficiente. A inteligência neste caso não se deve a uma eficiência de aumento das velocidades e conexões, é um sistema de inteligência que atua para ampliar a eficiência econômica do sistema virtual engrenado pela rede de computadores. O dinheiro circula e as mercadorias também. Porém, esses milhões de pessoas transformadas em trabalhadoras sem assalariamento, produzem valor para o capital? São mediadoras de mercadorias, mas não produtoras, a mesma tecnologia que aumenta a produtividade inclui esses trabalhadores como mecanismos de estocagem, distribuição e circulação. São trabalhadores em sentido, não no processo produtivo de transformação material, mas correspondem a um exército invisível que atua diuturnamente em favor de um mercado, de um sistema, mas que não pode mais dar saltos de valor.
Uma
sociedade virtual que não mais adormece. 24 horas, os virtuais, aos bilhões
deles permanecem vigilantes o tempo todo. O mundo virtual pede dedicação
exclusiva, não há mais ócio, não há mais preguiça, todos devem produzir alguma
coisa que seja publicável virtualmente, de receitas culinárias a prescrições
médicas e psiquiátricas, de análises políticas a todas as formas de permanência
das imagens em constante circulação. Jonathan Crary chega a afirmar, em seu
estudo 24/7: capitalismo tardio e os fins
do sono que
No entanto, o sono é agora uma experiência desvinculada de ideias de
necessidade e natureza. Ao contrário, e como tantas outras coisas, é tratado
como uma função variável, mas controlada, que só pode ser definida em termos
instrumentais e fisiológicos. Pesquisas recentes mostram que cresce
exponencialmente o número de pessoas que acordam uma ou mais vezes durante a
noite para consultar mensagens ou acessar seus dados. Existe uma expressão
recorrente e aparentemente inócua, inspirada nas máquinas: o sleep mode. A ideia de um aparelho em
modo de consumo reduzido e de prontidão transforma o sentido mais amplo do sono
em mera condição adiada ou diminuída de operacionalidade e acesso. (CRARY,
2016, p. 22)
O sono é um
elemento a ser considerado no espectro universal da Internet. Atentos,
vigilantes, produtivos, criativos, fiscalizadores e fiscalizados, os usuários
não se tornam apenas tais como usuários, são elementos da engrenagem do mundo
dos computadores, o mundo da imagem que se move continuamente e não se apaga,
não é desligada, a imagem que não forme, permanece com os olhos abertos, assim
como as telas e das páginas virtuais. Uma vez que os trabalhadores, empregados
ou não, continuam suas atividades nas telas dos computadores ou de seus
telefones inteligentes, não só atentos como produtivos, mesmo que não tenham
nenhum ganho material por isso, a engrenagem social do capital não para em
nenhuma condição.
O
desenvolvimento das tecnologias da informação e da rede de computadores é, em
última instância, o desenvolvimento da condição da burguesia que chegou ao
ponto de submersão em seu bunker, pois até mesmo ela não é capaz de dar um
sentido formal à formação da internet, mas, em virtude da crise de seu poder,
devido à crise estrutural do sistema, ela tenta controlar as redes por meio da
censura, direta ou indireta – na medida em que cria mecanismos jurídicos e
impedimentos econômicos e acesso, com isso “Uma das preocupações fundamentais do toyotismo consiste em limitar a
concentração física dos trabalhadores, ou até em dispersá-los fisicamente, e ao
mesmo tempo concentrar os resultados do trabalho através da tecnologia
electrónica” (BERNARDO, 2005).
A ciência de
caráter burguês representa a cisão entre o mundo real, transformando-o em
universal e cristalizando-o como verdade metafisica. A cultura burguesa se
impôs ao mundo pela dominação do gerenciamento da forma valor como fenômeno
estrutural no mundo das mercadorias. Em sentido estrito, a burguesia não impôs
a cultura de modo geral, impôs pelo poder político, o modo social de produção
do capital e à medida que este modo se tornou hegemônico como forma social
sistêmica, todas as expressões culturais foram submetidas à forma social do
capital e a partir de um momento em que historicamente o sistema havia se
consolidado, a indústria cultural passa a ser a expressão metabólica do próprio
sistema, as expressões da cultura, em seu leque criativo, se tornaram vis a vis
a própria cultura do capital. A cultura imposta pelo desenvolvimento das forças
de produção tecnológicas desemboca na internet como expressão da vacuidade ou
do processo inercial dessas forças que chegam ao limite da produção de valor e
de valorização do valor.
Referências
BERNARDO, João. Trabalhadores, classe ou fragmentos? (2005),
disponível em Para ler João Bernardo, http://www.4shared.com/dir/6353945/38db478d/Para_ler_Joo_Bernardo.html,
acesso em 10/01/2018.
CRARY, Jonathan. 24/7: capitalismo tardio e os fins do sono.
Tradução Joaquim Toledo Jr.. São Paulo: Ubu Editora, 2016.
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