sábado, 29 de junho de 2019

A mulher no centro da exploração capitalista


Por Atanásio Mykonios
(Trecho extraído do estudo sobre A mulher no centro das exploração: a cor e a raça da economia brasileira)


O problema da mulher no Brasil, quanto ao capitalismo, revela algumas faces de uma pretensa mesma moeda. A exploração da força de trabalho, num determinado momento da história do capitalismo não conhece gênero, a princípio. Mas conhece formas de exploração que são estruturais na medida nas condições das economias nacionais, que ainda se mantêm sob o rótulo de estados-nacionais. Por todos os lados, a sociedade produtora de mercadorias tem de, ela mesma, se transformar num imenso parque de mercadorias, a serem trocadas e os seres humanos, de modo geral, também são transformados em mercadorias, como força de trabalho e também como bases da exploração social do capital.

(...) a própria força de trabalho humana tem de se tornar uma mercadoria. Expropriada de qualquer acesso autónomo e voluntário aos recursos, uma parte cada vez maior da sociedade foi sendo submetida ao jugo dos "mercados de trabalho", ficando a capacidade humana de produção fundamentalmente heterodeterminada. Só nestas condições a actividade produtiva se tornou “trabalho abstracto”, que mais não é que a forma de actividade específica do fim em si abstracto do aumento do dinheiro no espaço funcional da "economia empresarial" capitalista, ou seja, separado do contexto da vida e das necessidades dos próprios produtores. (SCHOLZ, 2000)

Por outros motivos que não apenas o ingresso no mercado das explorações, a mulher enfrenta também as condições adversas de uma economia dependente, que não se estabelece como um eixo normativo dos altos negócios do sistema global do capital. Ao contrário, a economia nacional é conduzida e administrada como uma grande fazenda, aos moldes dos tempos coloniais, tanto quanto no que tange às formas de exploração de gênero, de cor e raça que ainda prevalecem, não como resquícios de um mundo deixado para trás, efetivamente são formas de exploração que reproduzem o poder econômico sobre as populações de mulheres e, sobretudo, na atualidade, com a força do poder político estruturante.
Não se pode deixar de escamotear o fato de que a estrutura econômica nacional é androcêntrica, racista, mais ainda do que ser apenas patriarcal, trata-se do poder masculino. O masculino que está enraizado em todos os mecanismos de controle da vida social, especialmente na forma da sociedade que produz mercadorias. Para o bem ou para o mal, a sociedade brasileira produz mercadorias, está inserida nas relações de produção global, seus instrumentos de controle financeiro são aos mais rentáveis e os mais bem-sucedidos do ponto de vista tecnológico, cuja eficiência é reconhecida mundo afora e com todos os atributos de uma economia aparentemente moderna, permanece na fronteira entre a exploração geral e a exploração que tem cor, raça e, sobretudo, tem no masculino a sua maior fonte de dominação.

O “dissociado” assim definido que, do ponto de vista do contexto androcêntrico da forma coberto pelo valor, no limite leva ao consumo de certo modo no vazio, aparece por isso, na teoria social masculina unidimensionalmente relacionada com a reflexão do valor, como a-histórico, uma massa mole e informe, tal como o feminino em geral na sociedade ocidental cristã, ao qual não se consegue aceder com a análise da forma do valor. Pelo contrário, o consumo de meios de produção utilizados na economia empresarial, como máquinas, bens de investimento etc. não está relacionado com a dissociação; esses mantêm-se espontaneamente no "universo masculino" do valor. (SCHOLZ, 2000)

Roswitha Scholz nos mostra que a mulher é um elemento dissociado da vida social e poderemos mostrar isto ainda mais nas condições em que se encontra a divisão do trabalho no Brasil, os ganhos, as médias salariais, a empregabilidade das mulheres em relação aos homens, a divisão das faixas de escolaridade, da raça, da cor, que nos oferecerá um quadro que reafirmará as condições estruturais ao mesmo tempo que lançará outros dados sobre a mesa a fim de que possamos compreender o modo de exploração que atinge as mulheres em todos os níveis de trabalho e atividades econômicas.
A pesquisa que ora é apresentada tem como base de dados o CAGED, órgão vinculado ao Ministério do Trabalho, que trata de recensear os dados que as empresas, com seus trabalhadores em registro formal são alvo de cadastros regulares, monitoramentos etc.

 
Referência Utilizada

SCHOLZ, Roswitha. O Sexo do Capitalismo: Teorias Feministas e Metamorfose Pós-Moderna do Patriarcado. [Excertos]. Original Das Geschlecht des Kapitalismus. Auszüge. In www.exit-online.org. Tradução de Boaventura Antunes. Disponível em http://obeco-online.org, acesso em 13 jan. 2019.

sexta-feira, 28 de junho de 2019

Análise de dados sobre a economia mundial – sobre 2018


 Por Atanásio Mykonios 
Mogi das Cruzes, 25 de dezembro, Natal, de 2018.



Os dados coletados nos últimos meses demonstram algo que, ao contrário do meu entendimento inicial, a superexploração que poderia aumentar o tempo de trabalho excedente, gerando assim o valor necessário para garantir a substância do próprio capital, a sua riqueza com lastro real, não pode ser realizada por meio desse mecanismo.
Em primeiro lugar, o aumento da produtividade, gera uma superprodução que se espelha, inicialmente, no PIB mundial e como tendência, nos PIBs  nacionais. Tal tendência é o aumento do PIB e a manutenção das massas salariais a patamares que não se alteram radicalmente. Considerando que a diferença entre PIB e massa salarial em torno de 49 a 33 Trilhões de Dólares e considerando que o sistema financeiro amplia o processo de valorização fictícia do capital; considerando que as estruturas de imposição da exploração com barateamento generalizado da força de trabalho não são capazes de diminuir a diferença real o que os trabalhadores produzem e o que realmente recebem em forma de salários; considerando que o sistema capitalista não é capaz de gerar, por si, novos empreendimentos que absorvam as massas de trabalhadores em quantidade suficiente para arrancar mais-valor; considerando que a tendência mundial é o aumento da produtividade a partir do aumento do capital fixo e também pelo fato de que os investimentos se dirigem basicamente ao maior incremento do capital fixo (incluindo o trabalho morto); também considerando que a alta concorrência não permite que as bases de negócios, as pequenas empresas, os pequenos comércios, mesmo em rede, não tenham a capacidade de extrair mais-valor por meio da força excedente de trabalho. Podemos então dizer que o capitalismo chegou ao ponto em que não pode ter na força de trabalho a sua âncora segura e decisiva.
Ou seja, a evolução do número de empregadores não é significativa a ponto de absorver mais trabalhadores em escala possível de reverter o fim da produção de valor. Segundo a OIT, em 2010, havia um total de 90,5 milhões de empregadores no mundo, em 2018, chegou a 104 milhões e em 2019, isto é, ano que vem, as projeções indicam 105,1 milhões. De 2010 para 2018, o aumento de empregadores foi de 14,92%; de 2010 para 2019, será de 16,13%; de 2018 para 2019, o aumento será de 1,06%.
Em contrapartida, podemos fazer o mesmo cálculo proporcional relativo ao número de trabalhadores no mundo. A força de trabalho em 2010 era de 3,1973 bilhões de pessoas, em 2018 chegou a 3,4986 e em 2019, segundo ainda a OIT, poderá alcançar a cifra de 3,5317 bilhões. De 2010 para 2018 o aumento da força de trabalho no mundo foi de 9,42%. De 2010 para 2019, 10,46%. De 2018 para 2019, o aumento relativo seria de 0,94%.
Os empregados estavam assim distribuídos, a saber. Em 2010 eram 3,014 bilhões, em 2018, 3,3105 bilhões e em 2019, serão 3,3425 bilhões. Em outras palavras, respectivamente, 9,84%, 10,90%, 0,97%.


Tabela que mostra o avanço nominal e relativo entre empregadores, força de trabalho e empregados

Empregadores
%
Força de Trabalho
%
Empregados
%
2010
90,5

3,1973

3,014

2018
104
14,92%
3,4986
9,42%
3,3105
9,84%
2019
105,1
1,06%
3,5317
0,94%
3,3425
0,97%
2010-2019

16,13%

10,46%

10,90%








Assim, é possível observar que mesmo havendo um incremento entre os empregadores, de 2010 a 2018, de 14,92%, a força de trabalho cresceu 9,42% e o de empregados, bateu na casa de 9,84%. Mas entre 2018 e 2019, o aumento de empregadores foi ligeiramente maior que o da força de trabalho e ainda dos trabalhadores efetivamente empregados. Se ainda compusermos a análise entre 2010 e 2019, maior margem cronológica, chegamos ao fato de que o número de empregadores aumentou em 16,13%, mas a força de trabalho não seguiu essa tendência, também os empregados no mundo estiveram abaixo do crescimento das empresas (ou empregadores).
Podemos então inferir que os trabalhadores empregados tem experimentado menor incremento do que o de empregadores e a diferença pífia entre 2018 e 2019, demonstra que o sistema parece não conseguir empregar em grande quantidade, mesmo com crescimentos robustos entre a faixa de tempo maior.
Por outro lado, o maior crescimento se verifica entre os trabalhadores empregados no setor de comércio e serviços. Os dados mostram um aumento gradativo e robusto de 2001 a 2019, sem nenhuma queda ou estabilização. O setor que mais tem experimentado uma queda significativa foi o da agricultura, seguindo a tendência contrária dos serviços e comércio. Ao passo que a indústria não apresenta recuperação em seus postos de trabalho, ao contrário, verifica-se uma tendência também à sua diminuição gradativa.
Se levarmos em conta o fato de que a maior parte da riqueza produzida pelos trabalhadores concentra-se no setor de serviços e comércio, significando que do total do PIB produzido em 2017, de 80 T, 50 couberam a esse setor em específico, mostra claramente que há um processo inercial incapaz de promover um aumento da base de valor por meio da exploração absoluta. Em 2018, a OIT já contava com 2 bilhões de trabalhadores na informalidade ou em processos de terceirização.
É preciso considerar que o setor que mais emprega terceirizados, informais e precarizados, não é o da indústria e na agricultura a tendência é eliminar cada vez mais os trabalhos precarizados. Tanto a indústria quanto a agricultura tenderão um processo de enxugamento do capital variável, dando lugar a cada vez mais eficiência, inovação, ciência, administração e burocracia científica, gerando assim um processo de produção de ponta, com maquinaria que não pode absorver as massas de trabalhadores em quantidade a gerar produtividade suficiente para o desenvolvimento da base do valor.
Ainda relativo ao ano de 2017, o setor de serviços e comércio empregou algo em torno de 1,6734 bilhão de trabalhadores e produziu, em relação ao PIB mundial, 50,053 Trilhões. A indústria empregou 735 milhões de trabalhadores e produziu 23,875 Trilhões e a agricultura, produziu 5,084 trilhões e empregou 866 milhões. Vê-se, portanto que o capital fixo está cada vez mais concentrado no conhecimento tecnológico. Quanto mais conhecimento científico empregado, maior a sua concentração, maior, por conseguinte, as condições de aumento da produtividade, o que gera uma superabundância de mercadorias que atravessam as fronteiras. No entanto, os salários não são capazes de absorver a circulação que, de modo bem simples de entender, encalha e precisa ser, de alguma forma compensado.
É impressionante como o sistema financeiro, engatado nas 502 maiores corporações, está sendo capaz de gerar uma quantidade de capital inexistente a fim de compensar a diferença real entre o produzido e o adquirido pelo “mercado consumidor”.
Na primeira e segunda fases do capital, a riqueza dependeu exclusivamente da força de trabalho, de sua espoliação direta e, gradativamente, indireta, por meio das condições relativas de exploração, dadas pelas condições gerais de produção. A riqueza concreta era dada pela formação do trabalho concreto  a riqueza abstrata era gerada pelo valor, isto é, pelo trabalho abstrato.
É por isso que o tempo se tornou a chave da exploração e do acúmulo de capital como riqueza abstrata, mas ainda, com enorme potencial de desenvolvimento da máquina produtiva, ou, em outras palavras, da grande indústria. Com isso, socialmente medido, o tempo de trabalho havia se tornado a mediação da produção de riqueza. Com isso, na era da grande indústria, em que o capital, como formação ideal, encontrara a adequação mais que perfeita para a sua realização como forma social e como forma abstrata, a riqueza, fundamentalmente, pressupunha o trabalho e, dito de forma mais afinada, como a riqueza da não-liberdade.
Mas agora, a riqueza não é mais produzida pelo trabalho, apesar de que a massa de trabalhadores não diminui em sentido oposto aos avanços da indústria e seu progresso tecnológico. A riqueza é agora produzida pelo capital fixo que não depende essencialmente da extração do tempo excedente da força de trabalho. Daí o fato de que o trabalho se torna precário ao extremo porque, contrariamente do que muitos ainda podem supor, quanto mais o setor de serviços emprega, quanto menos os setores da indústria e agricultura empregam, mais a sociedade, como um todo, empobrece, do ponto de vista das condições de geração de riqueza como ainda a entendemos.
Porém, para o capital em geral, ainda a sua forma está condicionada ao seu conteúdo, que se expande para manter o conteúdo numa formalidade que não mais o sustenta. O capital encontra, então, a sua antítese, a sua negação em si mesmo, o capital, afinal, historicamente, se encontra consigo mesmo, o seu total negativo, que não apenas nega a si mesmo, como abre o caminho para a sua destruição. Sem que os agentes o percebam, o sistema se inverte, encontra o seu inverso, a riqueza abstrata se torna a realidade real enquanto a riqueza material deixa de compor a consciência dos indivíduos, há como uma sujeição absoluta a uma metafisica que tem um suposto lastro num sistema cuja riqueza de fato não existe, é uma ficção, uma mentira, porque não está com os pés no chão.
Por outro lado, o aumento gigantesco, em escala geométrica e não aritmética, mostra que o sistema está totalmente à deriva, precisa aumentar cada vez mais os graus de refinanciamento das estruturas financeiras e para corroborar essa situação, as maiores corporações controlam toda a rede de produção, circulação e consumo, em contato direto com grupos financeiros que atuam em conjunto para controlar os preços e regular os fluxos de produção e do mercado de trocas em geral, ou, o mercado das mercadorias, tanto quanto a força de trabalho.
Também, pelas razões acima expostas, aumentam as dívidas privadas, numa proporção de 3 para 1 em relação às dívidas somadas dos estados-nacionais. O endividamento sucessivo pode ser observado nos dados apresentados em caráter simultâneo. Nenhuma dívida é estancada ou retrocede, ao contrário, todos os níveis de endividamento permanecem em estado de crescimento contínuo, como um moto perpétuo que age por si mesmo, sem nenhum controle efetivo, seja por parte dos estados-nacionais, seja por parte dos trabalhadores ou de organizações e movimentos sociais.
Mas não deixa de haver uma apropriação do tempo excedente de trabalho. Este não mais pode ser aplicado na forma tradicional da exploração na grande indústria. Agora, o próprio fato de haver uma quantidade enorme de trabalhadores no mundo dos serviços e comércio, mostra que o capital age de outra forma, está em busca de uma nova adequação que é a exploração do tempo livre, não como tempo de ociosidade, mas, sobretudo, como a consequência do incremento do capital fixo.
A riqueza abstrata atinge níveis nunca antes na história do capitalismo. Ao que tudo indica, poderá haver não apenas uma crise, como uma espécie de crise que faça derreter o dinheiro que não existe, como pode também derreter a diferença entre o produzido e o pago. Seria então necessário aumentar o capital variável, a fim de que houve possibilidade de aumentar as margens, não somente de lucro, mas as margens de valor e de mais-valor.
No ritmo em que a economia mundial avança e a iminência de uma quebra generalizada que, em termos concretos, será, ao menos, 20 vezes maior que a de 2008, considerando um intervalo de 10 a 11 anos, será impossível aumentar o capital variável a ponto de reverter esse processo e lastrear o capital de volta a um leito mais confiável. Para aumentar o capital variável, seria então necessário um esforço global para introduzir além do número que tem se mantido relativamente constante de empregados, ao menos um ou dois bilhões de trabalhadores, num ritmo alucinado e improvável de acontecer.
Restam, assim, para o capital poucas alternativas. Uma delas poderia ser o controle efetivo das commodities, as mercadorias e as matérias-primas que são a base de toda a produção de mercadorias. Esse controle poderia, se houver também um esforço concatenado de baixar os custos e os preços globais dessas matérias-primas a fim de fazer baixar o capital fixo. Contudo, para que o sistema encontre mecanismos para baratear as commodities, a fim de reduzir o capital fixo, seriam necessários esforços no sentido contrário, para aumentar a eficiência do próprio capital fixo, ou seja, a produção de commodities deverá seguir a mesma lógica das formas de produção em escala global. Ou, em outras palavras, é possível que o capital fosse levado a mais uma armadilha.
Diminuir o capital fixo seria, por outro lado, uma possibilidade de atacar o capital variável. Mas caímos no esmo círculo vicioso, pois para diminuir o custo do capital fixo, seria necessária mais eficiência, concentração de conhecimento científico a fim de garantir o barateamento do capital fixo, o que não redunda em garantias para o aumento do valor e do mais-valor por meio da exploração do capital variável.
De uma forma ou de outra, o capital se depara com a cristalização do trabalho científico. Mesmo que as grandes corporações garantam o domínio completo das mercadorias de base e das matérias-primas de base, elas têm de garantir que as empresas que estão sob seu domínio, estejam aptas a concorrerem no universo concorrencial global. Se houver, em contrapartida, uma tendência a um monopólio, não haverá condições mais de exercer o capitalismo como sistema social do capital.
É por isso que, de modo esquizofrênico e paranoico, o sistema social do capital procura encontrar brechas por todos os lados, fazendo com que o tempo e o espaço do tempo coincidam, convirjam, a fim de que todos os seres humanos possam ser explorados nos seu tempo livre. Quando me refiro a tempo livre, refiro-me ao tempo da não-produção concreta, real, o tempo da produção material que agora se torna produção imaterial. O tempo é o tempo total da vida dos seres humanos, só assim podemos imaginar que o capital esteja desesperado em encontrar uma nova forma de exploração, mas que permanece atada ao tempo. O capital coloca os 7,6 bilhões de seres humanos a trabalharem sem que seja necessário um sistema formal de controle do tempo, uma espécie de tempo marcado, com entrada e saída.
Isso mostra que o capital não consegue se desvencilhar de sua concepção original, não consegue se desprender do tempo do trabalho, preciso transformar o imaginário, o abstrato, o tempo fora da produção, em tempo real abstrato, ou seja, uma forma de arrancar o impossível. Nessas pretensas condições, o capital avança sobre a humanidade como um todo, mas continua a produzir mercadorias e a rumar para a sua total impossibilidade, tanto histórica quanto lógica. As duas esferas parecem caminhar, por algum tempo, paralelas e até, em certo sentido, como que, autônomas, mas eis que agora, história e lógica se aproximam e quando de fato se tocarem, ambas cobrarão, uma da outra, a sua própria contradição e a impossibilidade de realizarem-se como formas adequadas ao próprio sistema.
Se o tempo do não-trabalho pode ser considerado como substância da riqueza, então, esse sujeito social agora não é tão-somente o trabalhador, somos todos nós. A classe trabalhadora continua a existir, continua a ser explorada por uma parte do capital que não consegue mais arrancar dessa massa de empregados as condições reais para a geração do valor, sua rentabilidade está prestes a se tornar um deserto global.
Isto quer dizer que até certo ponto do processo produtivo material concreto, o trabalhador representava a subordinação formal e material da formação do capital como riqueza material e abstrata. Subordinação material que significa subsunção, isto é, o capital havia atingido a sua perfeição como conteúdo e como forma social, histórica e logica, havia se transformado em uma tautologia social. Agora o situação parece apontar para outro viés.
O capital atingiu uma nova forma, mas isso não quer dizer que o capital se tornou algo diferente de si mesmo, apenas exige formalmente novas adaptações ou adequações. Ocorre que tais não se verificam a contento, por isso, uma explosão ou podemos dizer, uma implosão da consciência quanto ao próprio trabalho, quanto ao estar empregado, quanto à exploração, quanto à consciência de classe.
Nesse sentido, o capital precisa ser destruído. Não há saída para ele, não podemos transitar no interior de um sistema que chegou ao seu fim, mesmo que ainda haja bilhões que trabalhem em troca de um salário que não representa mais a real condição de sua natureza. Mesmo que haja a tentativa hercúlea de aumentar a base de exploração sobre os trabalhadores e sobre os seres humanos que são capturados pela nova forma, seu mecanismo logico está entrando em rota de colisão com sua própria forma social global.
Não há mais estados-nacionais que sustentem essa condição, mesmo que se movam para a guerra, mesmo que se movam em direção à matança generalizada, mesmo que o fascismo se torne uma regra de controle social, mesmo até que a repressão aumente a níveis inimagináveis, mesmo que obriguem a humanidade a trabalhar 24 horas por 7 dias da semana, a base do capital parece não mais existir, como subordinação formal. O capital fixo é o exemplo disso. A concentração de poder que se expressa por meio da concentração de conhecimento, é a expressão desse desvario completo em nossa história.
Ao ruir o sistema financeiro, ruirão as forças que o sustentam. Mesmo que países como Rússia, China, procurem cercar a economia norte-americana, mesmo que seus negócios sejam realizados em suas próprias moedas, mesmo que o cerco à dívida dos EUA seja uma bomba relógio, nem mesmo a crescente economia chinesa será capaz de ampliar a base de valor global.
A riqueza não pode ser medida pelo tempo de trabalho. O novo ser humano que pretensamente surge dessa confusão, pois se trata de um sujeito social que caminha à deriva, numa nau que está afundando, mas este sujeito parece não se dar conta de que não há saída, mesmo que ele pule da nau, o oceano que o engulirá não o salvará, pois não há terra à vista, será afogado. Por isso, o capital é agora esse oceano que sem forma e a nau é apenas um elemento contingente.
Os discursos, as narrativas, os movimentos sociais, os partidos políticos, os próprios políticos, os gurus, os proxenetas, as viúvas, os satanistas, os sacerdotes de toda ordem, os militares de plantão, os meios virtuais, todos estão na mesma nau, escondidos em suas gavetas ou em seus aposentos.
Não penso que se trata de um novo ser humano, mas de uma forma social que coloca a humanidade em risco total, dado o fato de que cegamente ainda tenta nutrir uma contradição sem qualquer possibilidade de solução. Penso que temos de encontrar uma linguagem direta, franca, leal, sobretudo concreta, não uma linguagem apocalíptica, mas que tenha a clareza do que está acontecendo. Talvez a sociedade esteja mais preparada para dar o salto histórico, enfrentar o desafio de romper e construir as condições materiais e históricas reais para atravessarmos esse longo período de tragédias. Pois o que parece mais amedrontar as pessoas em geral é a imensa dificuldade em encarar o concreto imediato, os fatos que estão na nossa cara. Nenhum passado poderá nos salvar, mas o presente pode explicar o passado (Como Marx já havia apontado) como um fator tendencial.
Essas são as minhas considerações iniciais. Espero ter contribuído para a reflexão do nosso grupo.