Por Atanásio Mykonios
O que um bom
liberal, tornado neoliberal precisaria saber sobre o papel do Estado?
“Deve ser, pois,
um Estado que cria ativamente as condições para a acumulação de capital, que
protege os monopólios das crises econômicas, que enfraquece o poder dos
sindicatos de trabalhadores assalariados, que despoja os trabalhadores da
seguridade social, que privatiza as empresas públicas, que transforma a oferta
de bens públicos (como as estradas, os portos, etc.) em serviços mercantis, que
não só levanta, enfim, os obstáculos ao funcionamento dos mercados e das empresas,
mas é capaz de criar as condições para que estas ultimas operem de modo
lucrativo.” (Prado, Eleutério. A desmedida do valor. São Paulo: Xamã, 2005, pp.
132-133.)
Isso tudo está
na cartilha, mas para cumprir esses “desígnios” do movimento neoliberal, é
preciso criar condições morais extremas e necessárias, de que forma? A moralidade
recai sobre a malversação das condições de administração do Estado. De certa
forma, é onde a dita classe média se apega. A classe média patrimonialista e
detentora da moral religiosa encara a administração do Estado como uma missão apostólica.
A corrupção é o elemento mais importante nesse posicionamento ideológico. O discurso
e o suposto posicionamento contra a corrupção têm como objetivo chegar à classe
média, que raivosamente se coloca como guardiã da moral administrativa.
Por outro lado,
os empresários e os capitalistas estão acostumados à prática contínua da
corrupção em face das relações com o Estado que se tornou um agente econômico de
caráter passivo diante do movimento contraditório do próprio capital e das
forças produtivas.
Agora, o mais
interessante, do ponto de vista sociológico, são os pobres, que estão submetidos
às relações de exploração em cujo conteúdo reside, também, a corrupção. Eles trabalham
para a classe média que pratica seus delitos diários contra os explorados, com
seus privilégios e suas falcatruas; também trabalham para os grandes
capitalistas e são vítimas desse mesmo processo.
Assim, o Estado
tem funções que se assemelham às de uma empresa privada. Como tal, ele se
submete às regras do mercado, a corrupção é, em última instância, a lei do
mercado levada às raias do absoluto valor e da rentabilidade. Corromper representa
o ganho total na relação de mercado, da oferta e da procura. Mas eis que os próprios
corruptores criam uma cortina de fumaça, com seu discurso moralizante, dando a
entender que somente há um lado nessa relação. Ele age como uma empresa no meio
de outras empresas, tem bancos de investimento, tem petrolíferas, associa-se a
outras empresas. As empresas estatais têm de promover lucratividade e o Estado
precisa garantir a rentabilidade do capital em sua totalidade, em condições
reais e mínimas de realização do valor.
Como então
defender essa forma dita Estado? Os liberais e mais precisamente os neoliberais
parecem estar mais comprometidos e propensos em defender o Estado corporativo
administrado por tecnocratas e blindado pelos capitalistas associados. Sua moral,
é a moral de comerciantes que avança sobre o Estado e o controla nessa nova
fase do capitalismo.
A esquerda deveria
sim abdicar dessa forma Estado, deveria deixar de apoiar essas relações
estúpidas de um liberalismo aparentemente humanitário e pensar seriamente em
destruí-lo conjuntamente com o próprio sistema que o nutre – o capitalismo. E com
isto, ocorre que a esquerda fica presa, na verdade, refém de um modelo de
gestão pública marcado pelo processo político de dominação por meio de um
sistema representativo, que não representa nada a não ser ele mesmo. A liberdade
total é traduzida pela liberdade do negócio e do mérito e os representantes políticos
são apenas um elo nessa cadeia de manipulação. O cálculo econômico é deveras
significativo para todas as atividades, inclusive a atividade política.
Na atual
sociedade capitalista, os derrotados são agora vistos e tratados como inimigos,
a guerra é contra os não rentáveis, é preciso colocá-los sob a rédea curta e mantê-los
devidamente distantes, se possível em guetos bem demarcados territorialmente. A
alternativa é se conformar e manter-se obediente às regras do mercado. Para os
liberais atuais – os neoliberais – os pobres não contribuem social e
intelectualmente para o avanço das forças produtivas, nem mesmo podem ser
educados para tal objetivo, portanto, o ideal seria que eles não mais
existissem.
Ocorre que os neoliberais se escondem nos clássicos e em especial nos teóricos do Estado de bem-estar social e produzem uma imbróglio de conceitos e preceitos que não condizem com o real movimento do neoliberalismo, que atua como um trator sobre a sociedade. Não sei se por ignorância ou por má fé, até mesmo os teóricos liberais do Estado socialmente menos injusto, não cabem nessa onda de barbárie promovida pelo neoliberalismo. E ainda há quem pense que os neoliberais têm propostas de cunho clássico ou neoclássico. Enganam-se.
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