segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Espírito do tempo - espírito absoluto

Atanásio Mykonios

Não parece possível uma consciência absoluta que apreenda a realidade e a submeta. O espírito do tempo é o caos como espírito de si mesmo. O sonho nutrido dos mentores da sociedade pós-guerra agora atinge seu ápice. A fragmentação da formação social amplia a capacidade de movimento da consciência, cujo aspecto universal e abstrato reside na categoria máxima atingida pela sociedade que produz consumo e valor. Para os indivíduos, resta um espectro difuso de consciência aplicada como método científico a fim de garantir sua segurança pelos caminhos do caos. A democracia se confunde com o direito fragmentado dos sujeitos sociais, atuam para amealhar o que lhes é possível e neste caos, ninguém se atreve a uma solidificação ou unificação da consciência, pois há o pavor de que as estruturas unificadoras e assassinas voltem a conduzir todos para a destruição. Essa realidade árida transforma os seres humanos em fantasmas de si mesmos. Chegamos ao espírito absoluto da consciência da mercadoria, que paira sobre todos e todos se submetem, condicionados ao caos na Terra, enquanto o espírito absoluto incólume permanece.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Fascismos velhos e novos

Atanásio Mykonios



Houve uma tentativa histórica das classes dirigentes e das elites culturais nos países estados do capitalismo industrial de assimilarem todo processo econômico embutido na escala capitalista. Por períodos cíclicos, as elites sentiram o fluxo do valor sobre valor, como expressão de sua própria identidade cultural e étnica. Foram levadas a imaginar que seus ganhos e seu conforto sócio-material se deviam à sua forma de agir, aos caracteres genético-histórico-culturais. Nesses períodos em que havia menos turbulência social, nos pós-guerra, os movimentos políticos e sociais emergem das contradições do conservadorismo moral e ganham ares de liberação moral e política. As esquerdas avançavam e os movimentos contra-morais assume o controle das ações sociais. O sexo, o comportamento, as escolhas, as relações de natureza privada pareciam mais abertas e menos cerceadas pelo patrulhamento dos grupos morais. Parece que a prosperidade econômica gerava, na modernização, uma espécie de colchão para efetuar novas demandas políticas e morais.
Mas na história, nenhum povo que alcançou prosperidade material foi capaz de abrir mão de suas riquezas. Foi com os gregos, os romanos, os europeus, os japoneses e hoje com os europeus e os norte-americanos. Ao não abrir mão de suas riquezas, qual é a expressão desse processo na modernização? Fascismo! As identidades xenófobas, com sua cultura dominante, explodem por toda parte, a barbárie não se concentra apenas com os pobres e viciados, desempregados e confinados. As elites reagem com ferocidade, voltam a atacar as minorias, voltam a assumir o poder político, acusam e assumem a guerra total contra seus inimigos – pureza da raça contra seus detratores.
As elites são vítimas sua ilusão, pois ao gerenciarem o processo da sociedade que produz mercadorias, criaram em si a presunção de que são efetivas controladoras do sistema. A mercadoria não tem dono, não tem etnia, cor, formação cultural, não assume nenhuma história local ou regional, não assume nenhuma forma social autóctone, apenas se permite a um encapar das condições culturais, na relação entre valor-de-uso e valor-de-troca. A ilusão que essas elites alimentam na sociedade das mercadorias tem a mesma proporção alimentada pelas religiões em sua luta contra a modernização.

A decadência do capitalismo e seu colapso farão surgir por todos os lados novos e velhos fascismos com a pecha de salvação dos nichos nacionalistas e a condenação dos grupos fantasmas, supostamente aliciados pelos conspiradores históricos contra a cultura nacional.


segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Brutalidade e exaustão

Atanásio Mykonios

A brutalidade da forma social não está apenas na violência de corpos que lutam contra outros corpos. O mundo brutal recolhe para si a nefasta condição de abandono das vidas. Por mais que a consciência lute para manter, para si mesma um lugar confortável onde as pessoas estejam a salvo, a realidade encruada nos mostra que nada mais parece ser possível em impedir a barbárie das coisas e da sociedade. A barbárie atinge níveis compatíveis com uma espécie de natureza indiferente à tragédia. A vida econômica prevalece sobre qualquer anormalidade insidiosa, sobre a loucura, a preguiça, o sono, e mesmo o nada são condenados absolutamente por todos.
Há como que, um exército camuflado, que permanece à espreita e pune severamente o que tenta se desprender dessa brutalidade abstrata e real. Mas há ainda, para facilitar a brutalidade ideológica um torpor de consciência que nos torna ainda mais cúmplices dessa sociedade arruinada. Nenhuma palavra será capaz de sensibilizar a marcha fúnebre dessa sociedade sôfrega e embevecida pela apoteose da mercadoria.
Não consideremos apenas um invólucro do presente em que a história é incinerada pelo ordenamento do comprar e vender, pela borracha que apaga as mãos que criam o mundo em favor de papeis, comódites, ações, dívidas e estados absurdamente brutais com seus cidadãos. Consideremos a frenética e exaustiva repressão das ordens sociais, dos campos de concentração que se espalham pelo mundo com seus refugiados, suas hordas de desempregados, seus velhos abandonados e suas crianças famintas.
A brutalidade da mercadoria faz regredir o homem a uma condição de petição absoluta.
É preciso insistir, reconhecer o fim de um período, marcado pelo capitalismo, em que, sobretudo, vinga, cada vez mais, a estupidez, a barbárie, a indiferença, elementos que nos conduzem, há muito, ao precipício social. Somente quando reconhecermos, pela via do compromisso dialético que o processo chegou à sua exaustão, é que poderemos encontrar em nós, sociedade humana, alguma possibilidade de garantirmos a sobriedade diante da vertigem abissal de uma sociedade sem evidências concretas de sua própria realização como espécie humana.

A última instituição está ruindo

Estados estão se dissolvendo. A banca mundial espera pelo regresso das operações financeiras com generosidade de um carrasco, à espera das migalhas que serão distribuídas pelos abutres do mercado. O colapso das instituições não é uma ficção de Hollywood, ela é visível e o Estado será o último bastião do castelo de areia que desmorona sem qualquer ato fúnebre a lhe garantir a passagem para a eternidade.
A fim de garantir o inominável metafísico da esfera do valor, o dinheiro volatiza as esperanças e não garante os pés, nem o chão, nem a comida, nem o patriarcado das gerações que se empenharam para a apoteose do capitalismo majestoso da concorrência e dos produtos fartos. Na sociedade da abundância, abundam Estados sôfregos numa espiral esquizofrênica.
O capitalismo de estado vingou a si mesmo, como forma de promover a segurança dos investidores, garantindo o ordenamento jurídico das relações de troca. Agora é refém de sua própria ideologia nefasta - haverá então pouco a esperar a não ser a lógica demarcada da racionalidade dos números que vagam pelo espaço, em busca de um cofre que lhes dê guarita e segurança final.
Não importa o tempo que levará, será uma longa noite de gemidos, em que o moribundo será exposto ao seu próprio criador – a humanidade, sedenta por liberdade e carrinhos cheios de produtos. Seremos um arremedo de nós mesmos, entregues à bestialidade dos momentos em busca de comida.
Os Estados sucumbiram! Pouco restará em breve do sonho de um Estado ordenado e racional, a democracia não dará conta de sua obrigação em salvar o mercado. Tragados, os Estados serão a última certeza de que há vida útil no planeta.
O último bastião está por ruir.