terça-feira, 26 de novembro de 2019

O brasileiros lutaram e continuarão a lutar

Por Atanásio Mykonios



Penso que uma parte de nós, especialmente nas academias (não as de ginastica), olham para a sociedade brasileira de forma muito confusa. Muita gente tem visão de classe média, de gabinete, que critica e ironiza um tal “caráter” do “povo brasileiro”. Alguns ainda creem na indolência, na preguiça e no “comodismo” das pessoas que não se mobilizam e não reagem. Confesso que às vezes eu também caí nessa arapuca pseudo-ideológica, que que ideologia não tem nada, é uma análise rasa e de araque!
Os trabalhadores brasileiros sempre estiveram mobilizados, em determinados momentos, tiveram também a sabedoria de recuar, dadas as condições de repressão. Não nos esqueçamos de que a repressão sempre foi muito forte, sempre foi violenta, sempre foi de cunho sanguinário contra os trabalhadores, os negros, as mulheres, os desempregados. Os trabalhadores sempre lutaram, eu fiz um levantamento, de 1945 a 2018, foram registradas (exceto os 10 anos de chumbo da ditadura – 1969-1979) 33.956 greves, não houve um único mês em que os trabalhadores não se movimentassem, de um modo ou de outro.
Além disso, o Brasil viveu, ao longo de sua história, aproximadamente 101 revoltas, conjurações, rebeliões, guerras regionais, lutas de toda sorte, movimentos, golpes. O Brasil nunca foi esse mar de rosas, nunca foi esse lugar do “comodismo”. Ao contrário, lutas de resistência, de reação, de enfrentamento, conflitos etc.
Movimentos sociais, organizações sociais não governamentais, centenas de grupos nas periferias, grupos culturais, as ruas ocupadas quase todas as semanas. O povo brasileiro (essa coisa abstrata que não diz muita coisa) não aquilo que emana de nossos gabinetes refrigerados. As cidades são um amplo lugar de lutas, de enfrentamentos por espaços, a expressão de ocupações, de o avanço dos pobres que resistem em resistir por todos os lados. Ocupam os terrenos, os buracos, as vielas, os becos, organizam suas relações econômicas, as pessoas continuam, insistem, não estudam tanto, não têm a formação que sonhamos, mas os trabalhadores lutam.
O problema são as nossas lideranças – e nós mesmos, de modo geral. De tempos em tempos, a luta fica mais acirrada. De tempos em tempos, vem a repressão e junto com ela toda sorte de ameaças, o medo é muito grande. O Brasil foi governado, em boa parte, por governos de golpes e elitizados ao extremo.
Os trabalhadores, todos eles, nós também, continuaremos, somos a história dessa terra, milhões continuam atentos. Talvez não seja do tamanho que gostaríamos. Penso que também as elites econômicas, políticas e sociais, têm muito medo dos trabalhadores, que estão entupindo as periferias, as favelas, os mangues etc. O Brasil é grande, muito grande para o definirmos em um parágrafo.
Nós temos um modo diferente de estar nesse lugar, de lutar nesse lugar. É verdade que estamos sendo atirados aos esgotos econômicos e sociais. De alguma forma, teremos de enfrentar tudo isso e os trabalhadores têm enfrentado com a dignidade que lhes é histórica.