terça-feira, 9 de junho de 2015

O controle sexual milenar e a liberdade sexual - por que as sociedades não aceitam mulheres e homossexuais

Por Atanásio Mykonios



Naquilo que não é visível nas condições em que se apresentam as relações sociais, há que considerar elementos que não podem ser enxergados no mundo da superficialidade.

Nessa contenda, o que está em jogo, no grande e quase histérico discurso contra a orientação sexual, é o próprio sexo. A sexualidade é o centro escondido desse conflito de perseguições, de insultos, de raiva desmedida, de argumentos religiosos, de moral estruturada na metafisica das sociedades tradicionais, etc.

A questão sexual sempre foi um problema para as religiões. O sexo é um problema não resolvido, não refletido de forma ampla e profunda. Quem conhece um pouco de história, saberá como as culturas, os povos e suas religiões trataram o sexo e ainda o fazem.

Mulheres e homossexuais sempre foram mal vistos pelas religiões. Durante milênios, especialmente no período em que se inaugura a dominação social do masculino sobre o feminino (no Mediterrâneo, no Oriente Médio, no mesmo período histórico, alguns milênios antes da era cristã) provocou uma grande turbulência nas condições sociais do poder social – a dominação do processo de produção das necessidades passou a ser dominado exclusivamente pelo poder masculino. É nesse período que podemos observar a substituição, nessas regiões citadas, das divindades femininas por masculinas.

Controle sobre o corpo, controle sobre a ação, controle sobre o comportamento, controle sobre a imposição sexual. A monogamia foi uma construção histórica de domínio masculino sobre o corpo da mulher em função, especialmente, da procriação. Era mais do que evidente que o homem deveria controlar a produção da terra por meio da identificação bem evidente em relação à prole. Ou seja, os filhos tinham de ser identificados pela origem, a mãe era a certeza de que os filhos pertenciam a um homem, daí a monogamia ser imposta a fim de garantir os novos trabalhadores da terra.

O controle sexual é, sobretudo, um controle sobre o corpo e sobre o processo de produção. O fato de haver uma quantidade de pessoas que não aceitam a liberdade sexual nem o caráter distintivo da homossexualidade, indica, no meu entendimento, duas grandes dificuldades.

Uma dificuldade em relação aos mecanismos de controle sobre a produção por meio do corpo físico e sexual. Garantir a família, como os grupos religiosos querem, é tentar manter o processo da divisão do trabalho sob o domínio do masculino sobre o resto da sociedade – crianças, velhos, adolescentes, mulheres, homossexuais, etc.

A homossexualidade também sempre foi um problema para as sociedades agrárias, rurais. O fato de haver homens e mulheres que decidem não procriar causava abertamente um risco para a estabilidade da produção. Efetivamente, o problema relativo à proibição da homossexualidade é antes de caráter material e não espiritual.

A outra dificuldade que chama a atenção é que a monogamia, como bem apresentou Engels, traz a sua contrapartida que é a prostituição. Nela, as mulheres que não aceitavam o controle social imposto por meio da monogamia exibiam uma liberdade com a qual as mulheres que viviam na relação monogâmica não possuíam.

De certa forma, tanto a homossexualidade quanto a libertação da monogamia colocam o problema da liberdade sexual que foge ao controle social.

Antes, o que agride os religiosos, herdeiros da formação masculina da divinização do mundo, é a sua liberdade, alcançada a duras penas e que passa a ser uma afronta para os olhos monogâmicos da existência em sociedade.

A liberdade sempre causou uma série de entraves e dificuldades não apenas de aceitação, também no que tange às condições reais de produção, uma vez que, em grade medida, são pessoas e grupos que não aceitam o controle da produção e de suas relações constituídas pelo poder de um modelo de divisão do trabalho que foi, até certo ponto na história, sustentado por um modelo de acasalamento e de família que não é mais possível suportar.

O que essas lideranças morais exigem é um posicionamento absolutamente anacrônico com as alterações internas que o capitalismo experimenta na atualidade. Num modelo fordista de produção material e social ainda era possível manter a instituição da família nuclear, constituída por homem, mulher e filhos (por vezes alguns agregados), mas à medida que a revolução científica e tecnológica impulsiona o processo de produção, altera definitivamente as relações de produção e estas transformam a forma social até então organizativa da sociedade.

Tudo mudou, e no fundo, esses grupos que defendem desesperadamente um modelo de família e de organização social da produção, estão fadados ao fracasso, lutam por uma causa perdida. É bem verdade que as coisas mudaram, mas o capitalismo na sua condição essencial não mudou. Mesmo assim, e mesmo que o capitalismo ainda dure décadas, a formação social imposta pelas novas condições gerais de produção afetaram e afetarão as estruturas sociais e abalarão moralmente esses grupos, principalmente religiosos.

Lutam por uma causa perdida! Na verdade, já perderam em todos os quadrantes. O que lhes resta apenas é a tentativa desesperada de manter o impossível.