terça-feira, 29 de julho de 2014

No Caminho do CAPITAL ou a Destruição da FAIXA DE GAZA

Por Atanásio Mykonios

É difícil entender o conflito na Faixa de Gaza sendo um brasileiro, com fortes marcas da cultura não judaica nem islâmica, como um ocidental de esquerda. Mas não é nada difícil compreender que há nessa questão uma força de Estado agindo como ato terrorista.

fonte: blogdofavre.ig.com.br

O governo israelense está decidido a avançar o máximo que pode no território a fim de exterminar o Hamas de uma vez por todas. Mas não é só o que aparenta, Israel quer promover uma limpeza à moda de tantas ocorridas ao longo do século XX. Ainda assim, esses propósitos não explicam a magnitude desse ato. As forças armadas israelitas estão dispostas a pagar o preço calculado de uma catástrofe humana até o ponto em que a situação se torne insustentável, do ponto de vista da pressão internacional. Há um preço a pagar quanto à luta política no cenário internacional, Israel está sendo bancado pelas grandes potências e ninguém irá barrar isto a não ser as estas potências ocidentais, quando lhes aprouver e em acordo com Israel. Em outras palavras, o cálculo foi feito, levando em conta o potencial de destruição - há um prazo para fazer a limpeza, após esse limite, os próprios aliados entrarão em cena e farão seu teatro midiático, exigindo que as forças israelenses retrocedam, até aí, os objetivos necessários terão sido alcançados – destruição total e redução da Faixa de Gaza a um imenso campo de refugiados em seu próprio território.

Nesse sentido, não há força que possa barrar esse processo, o governo de Israel tripudiou sobre as declarações do governo brasileiro, e o fará com qualquer um que crie constrangimentos, de fato, nem a ONU será capaz de barrar o que está acontecendo no momento. Trata-se de uma máquina de guerra absurdamente superior a tudo que está presente no Oriente Médio. Este conflito provocado por Israel pode ter várias facetas. Ou várias causas. A própria ONU fala em crimes de guerra, o embaixador de Israel na ONU também fala em crime de guerra. Os israelenses têm um sentimento de ódio, os palestinos idem – a luta pelo melhor discurso na guerra é um fator de sua condição. Mas isso não é suficiente, é preciso uma série de razões que extrapolam as contendas locais. Gaza é um enclave, uma região demarcada e mantida com a força militar que a condena a uma dependência criminosa. Concentra uma demografia elevada, com problemas dos mais diversos. Os movimentos militares e os movimentos de guerra, no capitalismo, são ambos financiados, é preciso saber quem financia para minimamente entender as razões desse processo. Para o Ocidente, Israel é uma fonte inesgotável de interesses, é também um enclave constituído de forma hegemônica com o auxílio do contexto que à época vigia e das grandes potências aliadas, vencedoras da Guerra Mundial. É uma força militar inquestionável, ninguém se atreve a enfrentar tamanho poderio concentrado.

Fonte: www.gamedesire.com

Na verdade, a força militar israelense é a mais eficiente do mundo não em extensão, mas em concentração de esforços e metas. Seus vizinhos não são páreo, nesse sentido, os palestinos estão à própria sorte, tendo de recorrer a organismos internacionais, o que ainda é pouco, condenados a um extermínio. A Rússia está imbricada com problemas na sua região, mas no passado ela tinha uma influência importante, especialmente quando da ação da OLP (Organização para Libertação da Palestina), no entanto, agora, a não ser que seja interesse de Putin estender suas coerções da Síria à Faixa de Gaza, nada poderá deter essa incursão desastrosa no interior da faixa de Gaza. É o momento para Israel, afinal sua arqui-inimiga a Síria, que está em frangalhos com uma guerra fratricida que já ceifou mais de 170 mil vidas. A mobilização das esquerdas e de movimentos sociais pelo mundo afora não consegue criar uma força capaz de dissuadir politicamente o governo de Israel, ao contrário, este tripudia sobre todos. Este irá parar quando cumprir suas metas. O grande problema é identificar as razões que estão em causa nesse processo. Razões internas e razões macrorregionais, para além das fronteiras do Oriente Médio. Os colonos israelenses exercem uma pressão permanente sobre o Estado de Israel, têm poder político e mobilização, isso se deve ao fato histórico de que colonos e grupos ligados à terra são mais conservadores, por vezes reacionários e extremamente beligerantes. Esse é um elemento fundamental para Israel, a terra, a posse e a produção, tornou-se um fator de desequilíbrio na região com a política de Estado e assentamento progressivo desses colonos. Outro aspecto é que, diferentemente do que ocorre no território israelense, a Faixa de Gaza é ocupada por uma população que causa pânico em seus vizinhos. Mas a unidade dos palestinos parece estar longe de se concretizar. Mas é preciso lembrar que os palestinos foram vítimas, desde o início da ocupação do território, por parte de uma força desproporcional, nesse sentido, não se pode falar em organização terrorista mas em ação revolucionária permanente que, em vista da opressão de Estado, não há outra alternativa a não ser uma ação para libertar a Palestina dessa opressão. Por outro lado, a ação do exército israelense é uma das últimas coordenadas em larga escala, promovidas por um exército regular de grande envergadura. Podemos ainda observar que o exército sírio está em combate regular há mais de dois anos e, nos últimos meses a ação regular das forças ucranianas contra separatistas do leste da Ucrânia ganhou vulto. Na África observamos lutas intestinas, a Líbia está em um processo de desagregação, tendo como pano de fundo o controle do petróleo. Na Ásia grupos separatistas, mas ainda não se observa uma ação regular de grandes exércitos pelo mundo. Os norte-americanos mantêm forças regulares no Afeganistão, e espalhadas por todas as partes, bases militares, Inclusive,  ouvi um professor nos dizer que havia mais de 700 bases estadunidenses em todos os continentes.  O que isto significa? Os grandes exércitos não estão em ação. Nem os russos, nem os britânicos, nem os franceses, nem os americanos nem os alemães ou mesmo chineses ou indianos.

Existem as escaramuças cotidianas, ameaças, bravatas, chantagens, retaliações econômicas, diplomáticas e políticas. Isto significa que as grandes forças militares não estão em ação direta no momento. O que há é um esforço para conter conflitos locais e regionais que, de alguma forma, se interligam por meio de redes de financiamento ou de incentivá-los de forma indireta. A questão é que há um conflito que se estende da Ucrânia até Bagdá e pelo sul até Gaza e penetra a África pela Líbia e desce para o sul, espelhando-se pelo continente. Essa região está mergulhada em um banho de sangue. Coincidência ou não, essa região tem gás e petróleo. A luta pelo controle dessa região implica controlar e se possível defenestrar os grupos sociais que estão no caminho da rota de abastecimento dessa energia vital. Isso pelo fato de que esses grupos são e serão um empecilho para a rota de suprimentos, exatamente no momento em que Europa e EUA estão em crise sistêmica-estrutural. Nada indica que esses conflitos terão um fim pacífico até que as condições desse controle estejam absolutamente  dadas. Essas regiões estão se dissolvendo a olhos vistos, o que ocorrerá com as populações locais é ainda uma incógnita, no entanto, me parece crível imaginar, com o que temos em mãos, que estarão à mercê de forças transnacionais que controlarão essa região pulverizada por décadas de guerra. Essas forças serão compostas por um exército mundial. A meu ver isso não tem a ver com questões milenares relativas a diferenças religiosas e étnicas inconciliáveis, essas questões são uma espécie de estratégia diversionista que utiliza grupos extremistas para publicizar um conflito que não se sustenta apenas por ódios viscerais historicamente constituídos. Estados-nacionais, grupos extremistas, terrorismo, separatismo, são elementos de uma mesma realidade que se move em direção a um acerto de contas sobre o futuro próximo do capitalismo. Não se fala mais em ações revolucionárias. Essas populações estão no caminho desse projeto de larga escala, estão abandonadas porque nem mesmo seus estados-nacionais existem mais. É uma maneira que o grande capital encontrou para criar um modelo de administração fazendo implodir esses territórios que foram anteriormente constituídos à força e a fórceps, foram juntados povos e tribos em favor de um modelo burocrático muito à necessidade do capitalismo de estado, contudo, esse estado-pseudo-nacional não é mais interessante ao movimento que é impingido pela nova classe de tecnocratas globalizados, pelo movimento do capital que precisa encontrar saídas para garantir a produção insipiente produção de valor e para isto lança mão de novas estratégias que culminam na dissolução de estados fictícios.


O que importa é que essas regiões serão, doravante, zonas livres, onde as populações viverão um regime de extrema beligerância sem rosto definido, com total abandono e uma espécie de governo sem governo, enquanto a produção estará a cargo das empresas mundiais – o governo mundial está em vigência. Este governo englobará empresas, corporações, uma burocracia estatal-empresarial, uma força policial arregimentada em qualquer lugar do mundo. Nesses lugares que, de alguma forma, já se vive um ambiente em que o que existe é a lei do valor, assim como em outras zonas fora de controle, sem uma administração que burocratize a distribuição e a circulação. O que importa é que os nichos de produção fiquem nas mãos das grandes transnacionais e de seus aparatos administrativos. Outras regiões terão os estados-nacionais, cada vez mais enfraquecidos e sem possibilidade de articularem uma reação, a não se assumirem um confronto de magnitude indefinido no horizonte provável. Por isso, não me parece que há condições de barrar esse processo, nem mesmo os supostos opositores desses grandes movimentos do capital, uma vez que os BRICS, por exemplo, estão na corrida por espaços no mercado mundial. Os palestinos estão o caminho desse processo.