domingo, 10 de abril de 2011

Armados

Atanásio Mykonios 

Não sabemos quem somos. Não sabemos por que somos. A trivialidade da vida e uma espécie de estrutura platônica que abduz os indivíduos. Se antes estávamos submetidos a uma força tribal, a uma condição na qual alguma ideia comunitária prevalecia sobre os indivíduos, a sociedade atual transferiu aos sujeitos uma dose incontrolável de força e potência. Agora temos o aparente poder de decidir sobre tudo, especialmente quando estamos insatisfeitos.
O poder do eu erigido pelos gregos antigos se transformou em uma máquina destruidora. Um eu que pensa estar no controle, subsume tudo e todos, estabelece a necessidade imperiosa do conhecimento, amplia suas fronteiras para além das capacidades da natureza, reduz o mundo a um laboratório prestes a explodir.
Em nosso subterrâneo social há outro universo, talvez um universo freudiano, marcado pelo nosso próprio desconhecido. Não sabemos o que nos espera, nossas reações, o modo pelo qual reagimos a determinadas situações, o desenvolvimento de nossas taras e receios. Não há controle sobre nossas vidas, a fragilidade de um sistema que se apresenta onipotente, encarrega-se de criar um vácuo contínuo entre os indivíduos e ele mesmo.
Ampliamos nossas fronteiras, mesmo havendo uma superprodução de alimentos e bens de consumo, estamos no limite de nossas forças. As formas históricas não nos dão as ferramentas para a vida atual.
Assim mesmo, há um torpor diário que sustenta os negócios, garante uma rotina calma, apreende um desespero otimista e nos lança para a esperança fundamentalista de que tudo será resolvido de uma forma ou outra. O futuro é apreendido como um passado melhorado, nada mais.
Hoje, podemos dizer, sem receio de errar, que nos transformamos numa sociedade de armas. As armas são a extensão de um mundo potencialmente angustiado pela incapacidade de se tornar humano.
Toda a sociedade está velada ou abertamente armada. Receio de que estejamos armados até os dentes. Estamos nos auto-exterminando, lentamente, dolorosamente, somos inimigos armados e parece termos feito nossa escolha.
Esta sociedade atribuiu a cada um de nós um poder de destruição absoluto. Mas, por outro lado, a submissão a uma forma de relação social nos coloca como zumbis sociais. Aqui, como em qualquer outro lugar, a existência é muito frágil, resta pouco para fazer.